sexta-feira, 30 de maio de 2014

Que não nos falte...

Ontem foi o dia da espiga.
Dou por mim a pensar se os meus filhos saberão o significado que tem. Provavelmente, não. Mea culpa.
Ele (o ramo) aparece todos os anos cá em casa, já feito, substituo o novo e fresco, pelo velho e seco, e ali fica, impávido e sereno, até ao ano seguinte, nele depositadas as preces de que não nos falte o pão (espiga), o amor (papoila), o azeite (oliveira), a saúde e a força (alecrim), o ouro e a prata ,que a mim me soa a dinheiro (malmequer), e o vinho (videira), que eu dispenso, mas que dá jeito para quando se reúnem amigos e família que o apreciam.

Os meus filhos não saberão certamente o significado. Não, como eu, que me recordo de o apanhar quando criança. O dia da espiga, era um dia de alegria, em que a minha mãe se juntava a outras amigas vizinhas, elas e os filhos todos. Nós, companheiros de rua, de brincadeiras, de jogos de escondidas, de corridas desenfreadas, naquele dia, era o dia em que o montes eram nossos, nossos e das nossas mães, todos juntos, em busca das papoilas, da espiga, do alecrim, de ver quem apanhava a maior papoila, o alecrim mais bonito, de nos mandarmos para o chão, de sentirmos o cheiro da terra, de regressarmos de pernas e mãos arranhadas, enquanto a mãe compunha o ramalhete, atando-o com uma fita, e depositando-o num sítio seguro, até ao ano seguinte. Depositando nele a esperança de um ano melhor, de um ano sem faltas, e eu sabendo e vendo nos seus olhos, que a esperança existia, a esperança ver no meu pai (que pai não era) uma mudança, que a espiga trouxesse a magia, a magia do pão, do azeite, do amor e da paz, que era um pai que deveria ajudar nessa conquista, mas um pai que não fazia, que não queria, que pão houvesse, para ele, que vinho houvesse, para ele, tudo o resto era de menos importância, e talvez por obra e graça de uma espiga, ele caísse do céu, para quem com ele vivia.

Há muitos anos que não apanho a espiga. É logo pela manhã que ligo à minha mãe, e lhe pergunto "já me compraste a espiga?". Há muitos anos que é ela quem a compra. À porta do metro, na esquina de uma rua, longe dos montes de outrora, onde hoje não há papoilas, nem espiga, nem alecrim que se vislumbre. E a espiga aparece-me assim, uma oferenda comprada, dois euros. Dois euros que ajudaram uma família a manter o pão, o azeite, e que imagino que por esses montes e vales, com entusiasmo e alegria, levaram seus filhos a apanhar com eles.

Em seguida, e tem sido nos últimos anos assim, aparece-me outra espiga. A nossa dona Lena, outrora presença assídua na nossa casa, para ajudar na organização e limpeza da mesma, hoje presença mais escassa, que a espiga outrora abundante, também nos trouxe a crise por arrasto, e a nossa dona Lena, passou a vir menos vezes. Mas a nossa dona Lena, não quer que nos falte o pão, e o azeite, e a paz e o amor, que foi sempre isso que teve de todos nós, e por isso todos os anos, a nossa dona Lena, apanha uma espiga para si, e outra para nós.
E assim tenho duas espigas. Que vou depositar no mesmo local, e onde vou depositar a prece de que não nos falte o pão, o azeite, o trabalho e algum dinheiro, mas acima de tudo a paz e o amor.

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Quando for grande, quero um closet

O mundo perfeito para a maioria das mulheres ( onde eu me incluo ) divide-se entre aquelas que têm um closet, e aquelas que não têm.
Entre aquelas que durante todo o ano vislumbram a sua coleção de sapatos, sandálias, botas, malas, roupa fresca, roupa quente, roupa clássica, roupa casual, e afins, e aquelas que a cada meio ano carregam toda a coleção de roupa e calçado da estação finda, bem acondicionada, para a arrecadação. E carregam da arrecadação, de volta a casa e aos seus devidos lugares, todo o calçado e toda a roupa tão bem acondicionada (e amarrotada) da estação recém chegada.
E as mulheres do mundo não perfeito, sabem o quão difícil é, conviver com esta injustiça, ainda para mais quando em pleno Maio fazem quase trinta graus, e de repente fazem doze, e de repente está a chover, e de repente as botas estão acondicionadas, e não ali, à mão de semear, e de repente saem de casa com um sapatinho bege de camurça, tão primaveril, e completamente salpicado e quiçá estragado.
Uma injustiça, este mundo. O mundo e a meteorologia.
 
 

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Quando os sonhos são uma realidade ainda distante...

Andamos todos (neste singelo reinado) a sonhar com férias. Literalmente.
O meu despertador tocou dez vezes, e dez vezes o desliguei com aquele habitual virar para o outro lado, mais cinco minutos, mais cinco minutos (até ao limite dos limites).
O despertador da miúda começou a tocar. Insistentemente.
"filha, o teu telefone?"
"está na praia."
"ai está? então levanta-te, vai lá busca-lo e cala-o".

Estuda mazé que os exames nacionais estão quase aí à porta.  Até lá, praia, só mesmo em sonhos...

Mea culpa.

Eu, culpada me confesso.
Não exerci o meu direito de voto no domingo, e contribuí para a larga percentagem de abstenção.
Não é um acto do qual me orgulho (antes pelo contrário).
Mea culpa. Mea culpa.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Em estado de pré coma

Razões para uma prolongada ausência no blog...
O miúdo fez anos.
Às vezes pergunto-me como tenho estaleca (energia) para tanto. Os dois a festejarem aniversário no mesmo mês, dois mega jantares (preparar um jantar a meio da semana para trinta pessoas, para mim é mega), cozinhar em barda, sobremesas e bolo (obrigada BFF pela ajuda no segundo jantar na questão da doçaria), desarrumar e sujar em barda, limpar e arrumar em barda, e quando está tudo um brinco, o miúdo anuncia que não quer fazer uma festa com os amigos, quer  assim uma coisinha mais simples, juntar apenas uma meia dúzia de amigos em casa, e um lanche (boa, penso eu).
Faz-se a vontade a sua excelência. Convida-se a meia dúzia de amigos.
Sábado, era o dia. De manhã joga-se o último jogo do campeonato (de braço completamente ligado e imobilizado, mas joga-se pois claro, que isto de ficar de fora, não cabe na cabeça do miúdo), termina-se o jogo, e assim, num ápice, a meia dúzia de convidados, passa a uma dúzia (a bem dizer, toda a equipa de futebol).
Alguém se lembra da final da champions, e assim num repente, o lanche combinado, estende-se para um jantar a fim de verem em conjunto o jogo.
Casa cheia, algazarra, banhos de piscina (muito embora estivesse um frio de rachar), banhos de banheira (para aquecer alguns quase roxos e hipotérmicos), roupas, ténis, toalhas e afins em barda, lanche em barda. Futebol dentro e fora de casa, varão e cortinados no chão (não sem antes terem caído em  cima da cabeça de um, provocando um ligeiro galo), curativo no pé de outro que deixou uma ligeira fatia do calcanhar numa pedra, e a festa (não, não era uma festa, era apenas um simples lanchinho) prosseguiu.
Início da champions, guerra para apanhar o melhor lugar do sofá, sala de pantanas para que suas excelências ficassem todas bem refasteladas, vinte e oito bifanas a fazer, doze litros de sumos e colas, carcaças abertas ao meio, intervalo e janta(rada).
 A recolha das criancinhas seria no apito final, mas o jogo prolonga-se.  A algazarra prolonga-se.
Os moches sucedem-se a cada golo do Real, o braço do miúdo ressente-se do ensanduíchamento, o jogo termina, e um a um, começam a ir embora.
Sobram quatro. Para dormir (uns dias antes : "mãe como é só um lanchinho, posso convidar uns para dormir?").
Faz-se a vontade a sua excelência. Camas para todos. Casa semi arrumada. Silêncio às duas da manhã.
Eu, em estado de pré coma, ainda a recuperar.
Sua excelência, o miúdo, feliz.
 
 

terça-feira, 20 de maio de 2014

Dores de crescimento

Este fim de semana tive (mais uma vez) a constatação de que ao trazermos outras vidas a este mundo, passamos a partir desse momento a acrescentar essas vidas e essas vivências à nossa. E com elas, carregamos tudo. O amor, a alegria, as tristezas, os sucessos e os insucessos. E a dor. As dores de crescimento são inevitavelmente difícieis (mas necessárias). Já passei por elas, passo agora novamente através deles. 
O miúdo teve mais um jogo este fim de semana.
Num lance disputado caiu mal e magoou-se num braço. Eu percebi que ele se tinha magoado a sério, caso contrário nem se teria queixado. Continuou a jogar. Percebi que ele estava mal. Comecei a ficar em nervos. Apetecia-me gritar, para ele, para o treinador, para alguém. Não o fiz. Nunca o faço. Vejo o jogo, impávida e serena (uma serenidade apenas aparente). Dez minutos depois, foi ele quem pediu para ser substituído e saiu em lágrimas. Lágrimas pelas dores, mas acima de tudo por abandonar o jogo, a equipa. Foi a custo que o arranquei dali, rumo ao hospital.
O pior cenário não se comprovou. Nada partido. Tendões e ligamentos afectados, braço ao peito até parar de doer. 
Durante todo o fim de semana dezenas de vezes a mesma pergunta. Se no próximo fim de semana estará recuperado para jogar. Porque mesmo que não esteja, quer jogar. Porque é o ultimo jogo. (porque está mal habituado, porque joga sempre e nunca é substituído) Porque vive aquilo com paixão e dedicação como se não houvesse amanhã. 
Ele sofre com esta angustia. Eu sofro com ele.
Depois penso nos sofrimentos que ainda aí vêm. Dele. Dela. A primeira paixoneta, o primeiro desgosto de amor. E nestas dores de crescimento que os vão acompanhar, e que eu vou acompanhar com eles. Que fazem parte, que são importantes para o seu desenvolvimento enquanto pessoas, mas que doem. 


quinta-feira, 15 de maio de 2014

Dos momentos em que a hesitação pode sair cara

O meu miúdo é benfiquista.
Foi por isso ontem, bastante desolado para a cama. 
Aconcheguei-lhe os lençóis, e disse-lhe aquilo que não serve de consolo, não é  reconfortante, mas que de alguma forma mostrava o meu apoio e a minha solidariedade neste seu momento de profunda tristeza : "mereciam ter ganho mas deixa lá. Fica para a próxima".

-Sabes mãe, o que me chateia é que nos penáltis uma pessoa não hesita. Tu chegas lá, escolhes o lado da baliza para onde vais rematar, mas não olhas para esse lado, para o guarda redes não adivinhar. Depois inclinas um pouco o corpo para o lado contrário do remate e ainda baralhas mais o guarda redes. E depois com força, rematas. E é golo. Não hesitas, sabes mãe? Não hesitas. 

Em tantas outras noites, fui eu a dar um ensinamento ao miúdo, nas centenas de histórias que inventei nesse intuito. Ontem fui eu quem recebeu um ensinamento. Na vida por vezes temos momentos de hesitação. Aprendi ontem que a marcação de um penálti não é um desses momentos. 






quarta-feira, 14 de maio de 2014

Vivam as pulseiras de elásticos!



Sempre tive uma tara por moda, roupas, sapatos, malas, e afins.
E hoje posso dizer que estou na moda.

Já tenho uma pulseira de elásticos, oferecida pela filha da BFF, que isto cá em casa é tudo muito pouco dado às artes manuais. O miúdo então, foge delas como o diabo foge da cruz ( não foi à toa que teve um mísero 3 a EV e ET as duas disciplinas que requerem o jeito com as mãozinhas "mas alguém quer ser evêtista ou etista na vida?" diz ele).

Assim, e sendo que estamos numa época de vacas magras, estar na moda por tuta e meia é o que se quer. E vivam as pulseiras de elásticos! 

terça-feira, 13 de maio de 2014

Nunca fiando.



Hoje almocei no Lx Factory. Aquilo é mesmo a minha cara, ou como diria a minha filha, a minha onda. 
Uma mistura de velho e de antigo, uma mistura de novo e moderno, um toque grunge, um toque vintage, e depois de meio jarro de sangria, um toque de tudo e mais alguma coisa, que o efeito ainda nem passou por completo. 
A festa de aniversário da miúda vai ser lá. 
Aquilo é tão a minha cara (e a minha onda)  quanto é a dela, por isso (embora ela  ainda não saiba desta variável)  ,  enquanto a grupeta dela janta no restaurante que escolheu, eu e a minha grupeta jantamos mais ao lado. 
É a chamada liberdade lenta (e camuflada ). Porque depois do que o gerente do restaurante me contou destes grupinhos de miúdos (tão recém) adolescentes ( nada que eu não soubesse ), nunca fiando. 


A febre dos cromos cria ilusões tão boas

Ontem, à chegada ao colégio:

Eu- Então filho? O teste de matemática correu-te bem?
Ele- Correu muitoooo bem, mãe! Muito bem mesmo! (enquanto me afagava os cabelos com as duas mãozitas num gesto quão carinhoso, quão raro assim, publicamente).
Eu- Mas era fácil?
Ele- Não mãe. Era muito difícil mesmo. 
Eu- Mas correu-te bem?
Ele- Correu. Compraste-me cromos para a caderneta?
Eu- Não. Estão esgotados. Mas fizeste tudo, no teste? 
Ele- Não. Deixei uma. 
Eu- Deixas-te uma? Então isso é que é muitoooo bem?
Ele- Deixei uma, e houve lá mais duas ou três que tive dúvidas... Sabes, aquilo não se podia usar calculadora, e então... então olha, houve lá uns cálculos que já sei que devem ter saído assim um bocado mal. Arredondei, 'tás a ver? O teste era bué lixado, mesmo. 
Eu- Então afinal não te correu bem?
Ele- Bem... correu assim para Satisfaz, 'tás a ver? Tipo isso. Mas amanhã fazemos a segunda parte do teste e sei que me vai correr melhor. Achas que amanhã já há cromos?

Hoje vou calcorrear todas as papelarias deste universo e do outro em busca de cromos do mundial. E vou ficar na ilusão (durante uns dias) que o teste de hoje, lhe vai correr assim para, tipo, excelente. 


domingo, 11 de maio de 2014

De babete, pelo top ten nacional

O príncipe deste reino, é mesmo um miúdo muito modesto.
Detesta que eu enalteça publicamente o que quer que seja relacionado com a sua pessoa (e eu nem sou muito disso). 
Talvez por essa razão, me tenha contado que foi aos nacionais do Super T Matik na disciplina de cidadania , já depois de ter participado no mesmo. 
Julgo que terá feito o concurso na turma, depois inter turmas , e tendo ficado apurado, o nacional. Julgo. Porque me contou a correr, assim mais ou menos "ah, é verdade hoje fui aos nacionais do Super T e até acho que nem me correu mal de todo". E à meia dúzia de perguntas que lhe fiz sobre a questão, só ouvi que aquilo era cidadania, não era propriamente matemática, ou português, não havia razão para entusiasmo. 
Ontem, já depois de eu nunca mais me ter lembrado da questão, disse-me "ah, é verdade, acho que os resultados dos nacionais saíram ontem. Vê lá aí na net que eu palpita-me que posso ter ficado nos dez melhores". 
E ficou. Independentemente dele ter desvalorizado a disciplina, ver o meu filho no top ten nacional (do que quer que seja) é um motivo de orgulho gigante. Vai daí que,  além de estar de quarentena por causa da sarna que assolou aqui a malta , estou também de babete a amparar a baba. 


sábado, 10 de maio de 2014

Sarna para me coçar vezes quatro.

O cão tem sarna.
O que é que uma pessoa faz? Vai ao veterinário, ouve o maldito veredicto (sarna), paga os vinte e cinco euros de consulta, mais não sei quantos euros da injecção de tratamento da dita (sarna), mais não sei quantos euros dos comprimidos para evitar a comichão que causa ( a sarna), mais não sei quantos euros pelo shampoo calmante da erupção provocada (pela sarna).
Ouve com atenção os cuidados a ter, e as implicações que daí podem advir.
Pega-se aos humanos. Que novidade. Uma pessoa já só precisava de ouvir o veredicto final da boca do entendido (ainda com a ténue esperança de ouvir algo como "isso parece-me mais uma alergia"), para concluir que as marcas e comichões que se tinham alastrado nos braços nos últimos dois dias, eram aquilo que já se suspeitava. O bicho tinha. Aqui a pessoa também.

Uma pessoa pergunta ao entendido veterinário o que pode fazer por si, para erradicar o parasita de vez. E o entendido informa que não é entendido nessa matéria, e que uma pessoa se deve dirigir a um dermatologista com urgência. E é o que uma pessoa faz, porque entretanto já a filha se coça à brava, e isto até chegar ao filho deve ser uma questão de horas. 
Uma pessoa mostra ao segundo entendido os braços, que olha e murmura apenas "hummm" enquanto vislumbra ao mesmo tempo as centenas de sinais que uma pessoa apresenta no peito (os visíveis ). Uma pessoa está inquieta e ainda com esperança no "isso parece-me mais uma alergia", quando o entendido pede para ver com atenção a imensidão de sinais com que uma pessoa tem vindo cada vez mais a ser brindada, e com os quais neste momento (ou em algum outro) se preocupa. E ainda ouve que há ali um ou dois que mereciam ser tirados, quando o que uma pessoa quer neste momento é tirar a sarna. 

Uma pessoa ouve que tem sarna, prepara-se para a injecção, e para uns quantos atarax e banhos dermo-calmantes tal como o bicho, e eis que... nada disso. Uma loção corporal a espalhar em todo o corpo. Uma pessoa larga noventa euros de consulta, compra a loção e resignada dá inicio ao tratamento. Permanecer com a mesma, impregnada na pele, durante vinte e quatro a quarenta oito horas (sem tomar banhinho). E o cheiro? Simplesmente maravilhoso. É como ter quitoso ou outro remédio qualquer anti piolhos (que também por cá os houve em tempos), espalhado por todo o corpo, emanando um cheiro que se entranha na roupa, na casa, nas narinas, em todo lado, durante quanto tempo? 
Julgo que esta família vai hibernar. Até erradicar com a sarna. E com este cheiro. E talvez dê o cão para adoção (ou não).


sexta-feira, 9 de maio de 2014

Sarna para me coçar. É isto.

Agora estou mesmo chateada. Porque o cão tem sarna. Porque o vet diz que veio do criador já com ela. Porque como diz o ditado, arranjei sarna me coçar. Literalmente. Literalmente MESMO.
 

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Três gatos pingados, que não podem com uma gata p'lo rabo



Estamos todos a modos que de rastos, cá em casa.
Três gatos pingados (mais um cão pingado) que não podem com uma gata p'lo rabo.
O levantar o rabo da cama a horas decentes de sairmos de casa sem correrias, tem sido algo que nenhum de nós tem conseguido fazer. Arrastamo-nos da cama quais lesmas, e é a essa velocidade que começamos os primeiros movimentos do dia, até percebermos todos que os minutos não andam à mesma velocidade que nós, e temos de acordar numa corrida contra o tempo.
A miúda ainda não recuperou da viagem de finalistas. O miúdo começa a acusar o cansaço de tanto exercício físico. Eu ando esgotada com tudo, e a tentar empurrar.
Estamos todos a precisar de férias. Bem sei que ainda não foi há um mês que fomos a Londres, mas não é dessas férias a que me refiro. Essas, apesar de muito boas, vieram colocar mais uns quantos quilômetros em cima das nossas pernas já cansadas. Precisamos de férias de papo para o ar, de praia, calor, sem preocupações com horários, a não ser fujir do sol na hora de maior perigo. Precisamos de descanso, de banhos de mar, de pés na areia. 
Enquanto esse dia não chega, vamos empurrar. E tentar empurrar com alguma energia e empenho. Os miúdos têm tarefa difícil, os dois com muitos testes pela frente, seguidos de exames nacionais. Eu, passado o aniversário da miúda, em que preparei o habitual jantar (que se traduziu num dia inteiro na cozinha), estou já a pensar no do miúdo daqui a quinze dias. No entretanto, a pilha da roupa acumula-se, e essa, não pode passar de hoje (dada a constatação matinal de que as meias e cuecas estão todas algures embrulhadas no monte, e o miúdo já não tinha calças para vestir). 
O cão, esse, está com sarna. E em relação a esse pormenor, estou tão zangada que nem me apetece debruçar sobre ele neste momento (debruço-me mais logo, quando tiver a roupa passada, e já quase não tiver forças para lhe fazer o devido tratamento).

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Fez ontem quinze anos.



Minha querida filha,
Fez ontem quinze anos. Fez ontem quinze anos que trouxeste luz à minha vida.
Não posso dizer que ainda me parece que foi ontem, porque não me parece. Não é essa a sensação que tenho, quando olho para trás e penso nos quinze anos volvidos.
Olho para trás e penso que era uma miúda, ainda.
Uma gravidez não planeada, uma série de acontecimentos novos na minha vida. Tudo de enxurrada. Recordo-me que embora fosse uma experiência totalmente nova e inesperada, vivi a gravidez de uma forma tranquila, sem grandes questões, inseguranças ou medos. Recordo-me de o pai, me ter oferecido uns quantos livros de puericultura, quiçá na esperança que eu me debruçasse sobre os mesmos, quiçá na inquietude da nossa inexperiente juventude.
Os livros, esses, permaneceram intactos sem que lhes tivesse prestado qualquer atenção. A minha serenidade, levava-me a crer que a maternidade era uma coisa intuitiva, e eu saberia cuidar do meu bebé sem o uso dos manuais. Afinal, eu tinha um trabalho de alguma responsabilidade, a faculdade à noite, e outros manuais com que me debruçar.
Esta minha serenidade e intuição, levaram-me a crer inicialmente que tu serias um rapaz. Não que tivesse preferência no sexo, mas era uma intuição. Uma intuição falhada, soube alguns meses mais tarde.
Recordo-me que faltava muito pouco tempo para tu nasceres, quando sonhei contigo pela primeira vez. Sonhei que te tinha nos braços, e que eras loirinha de olhos azuis. E fiquei com a convicção de que eras mesmo assim.
No meu trabalho, vivia rodeada de homens, sendo que eu era a única mulher do meu departamento. Já eu estava  gorda que nem um pote, com dezassete kg a mais em cima do lombo e sentia na maioria deles o pânico de que a qualquer momento eu estaria prestes a explodir. E todos me questionavam o porquê de continuar a trabalhar, uma vez que estava já em fim de tempo. No trabalho do pai, eram as mulheres dos colegas dele que me questionavam esse porquê (julgo que apesar de nenhuma estar prenha, nenhuma delas trabalhava na altura). A mim, fazia-me confusão não o fazer, e entre o trabalho, a faculdade e as lides de casa (algumas lides de casa), ainda fiz o teu enxoval, e foi na minha hora de almoço que comprei o teu berço, a colcha e outros apetrechos, tudo em tons de azul, que na altura tinha a mania que não gostava de rosa (e não, não era por ter tido a intuição de que aí vinha um rapaz, mas esta minha mania anti-rosa que durou muito pouco tempo, acabou por se traduzir numa grande poupança, quando três anos depois nasceu o teu irmão).
Trabalhei portanto até ao ultimo dia. Não planeei o parto, não fiz aulas de preparação, e quando senti chegado o momento fui para o hospital.
Não foram horas fáceis. Nem tão pouco, foram poucas. Durante as treze horas e meia em que esperei pelo tão ansiado momento, o pai , mais nervoso que eu, tentou acalmar-me com festinhas. Garanto-te que quase levou uma chapada em troca. Lembro-me que vociferei umas quantas barbaridades, entre as quais que nunca mais na vida iria ter outro filho.
Quando tu finalmente nasceste e te colocaram nos meus braços, chorei. Mas isso, não deve ser uma novidade para ti. Tu sabes que eu choro. Sabes que choro de cada vez que me emociono e esse foi talvez o momento mais carregado de emoção, em toda a minha vida. Estavas finalmente nos meus braços. E eras exatamente como eu tinha sonhado. Os teus cabelos eram quase brancos de tão loiros que eram. A tua pele era branca, quase transparente. Os teus olhos, tão azuis como o mar.
Tinhas umas mãos e uns pés grandes, coisa que fez com que a tua pediatra nos tivesse feito crer até há bem pouco tempo atrás, de que irias ser alta e espadaúda. Hoje percebemos todos (inclusive ela) que apesar das mãos esguias e dos pés em estilo barbatana, se chegares aos meus míseros cento e sessenta centímetros será uma sorte.
Julgo que a maternidade a levei mesmo por intuição. E grosso modo, não me parece que tenha feito um mau trabalho. Tirando o facto de  não te ter comprado uma chucha anatômica (a inexperiência tem destas coisas ), e de te ter enfiado no primeiro dia com uma chucha tamanho XL pela boca adentro, o que fez com que, quando me tivesse apercebido do erro, tenha sido tarde de mais e te tenha custado (a ti e a mim, em perspectivas diferentes) um ano e meio de aparelho para endireitar a caramalheira toda.
O facto de teres usado chucha durante muito tempo também não ajudou. Mas, também de uma forma intuitiva, deixei que a usasses até quereres (assim como fiz com o teu irmão). Achei por bem não fazer-te passar por esse sofrimento, já que durante meses insistimos na chucha como forma de acalmar, e depois o desmame forçado, pensava eu, devia ser algo difícil e doloroso (pronto, o facto de eu ser fumadora, ajudou nessa minha decisão do "chucha até quereres, que isto do vício é tramado"). Assim, e da mesma forma descontraída e leve com que sempre tens levado a vida, ignoraste até aos seis anos os comentários alheios de que já eras quase uma senhora e que feio era, ainda de chucha, e quando estavas prestes a iniciar o ciclo primário, foste tu quem decidiu que a chucha era uma coisa do passado.
Ao longo destes quinze anos, foram várias as vezes que a tua pediatra te apelidou de uma criança feliz. E é assim que eu te vejo. Descontraída, muitas vezes no teu mundo tão próprio, mas feliz.
E é essa felicidade que irradias todos os dias que me enche, que me preenche e me torna uma pessoa feliz. 
Fez ontem quinze anos que trouxeste luz à minha vida. 
Love you.

sexta-feira, 2 de maio de 2014

A tara dos homens. Mamas.

 
 
Ontem cheguei à conclusão que há coisas que são mesmo inatas. Nascem connosco como um dado adquirido. Estão intrínsecas à nascença (na maioria dos casos). Falo da paranoia que o sexo masculino tem por mamas.
Ontem, a pedido da minha irmã, fiquei com o meu sobrinho que tem dois anos, enquanto ela foi dar uma volta com o maridão.
O miúdo que até há pouco tempo não ia assim muito à bola comigo, portou-se lindamente. Fiz-lhe todas as vontades, incluindo mil viagens da sala para o quarto do meu miúdo, enquanto eu abria armários e ele descobria os brinquedos já guardados e não utilizados há muito, pelo primo. Dei-lhos todos, enquanto ele os ia espalhando pela casa, e me fazia recordar outros tempos, em que difícil era manter uma assoalhada arrumada.
A hora de dormir foi mais complicada, uma luta entre ele e eu, enquanto o primo desistia de ajudar, e se refugiava no seu quarto de porta fechada e me avisava "não o calas e os vizinhos daqui a bocado estão aqui a bater à porta".
E ele, guinchava de cada vez que eu apagava a luz e falava na palavra ó-ó.
Então de luz acesa, cantei. "Era uma vez um cavalo, que vivia num lindo carrocel... ", e enquanto cantarolava a única canção de outros tempos de que me recordo, o miúdo descobriu as minhas mamas. E mexia ora numa, ora noutra. E depois, guinchava. E eu comecei a contar até dez. Literalmente. Com as duas mãos fechadas, ia levantando um dedo de cada vez, enquanto contava vagarosamente "um, dois, três...", e ele repetia o tês, o cinco e o sete, afastava as minhas mãos já todas abertas, porque o limite eram o número de dedos, e mexia numa mama, a seguir na outra.
Lembrei-me que o meu filho nesta idade, também tinha esta tara.
E tentei arranjar outra distração que não fossem as mamas, e tentei enfiar-lhe um biberon de leite pela boca abaixo. Não resultou. Guinchos outra vez, e eu a ver o caso mal parado. Guinchos, e as minhas mamas. Tentei aninhá-lo de luz apagada, a ver se se esquecia de que era eu, a tia renegada até há pouco tempo. E lá vinha ele com a mãozinha, apalpar uma mama, e depois outra. E guinchava (imagino que a pensar, estas mamas são diferentes).
E já exausto, de guinchar, de lutar contra o sono, tirou a chucha, e disse "quéio a mãe" e adormeceu.
Ouvi a sua respiração profunda, matei saudades daqueles cheiro a bebé, da pele macia, e do tempo em que os meus eram assim pequeninos e ainda os aninhava em metade do meu corpo.
O resto da noite... o resto da noite foi numa constante proteção das... minhas mamas. Proteger-me não das mãozinhas curiosas, mas dos pés em constante movimento.

À descoberta do mundo

Foi há um mês que eu fiquei assim, a modos que desasada , porque a miúda foi para uma visita de estudo de três dias. A Évora, que é já ali. Um mês volvido, e lá foi ela outra vez. Mais três dias, desta vez ao país vizinho. Naquela a que chamam, a viagem de finalistas do 9º ano. Servem estas viagens para de certa forma, nos preparar para o que aí vem?
Julgo que de certa forma sim,  servem. Se no passeio a Évora me senti completamente angustiada e de coração apertado, nesta estou um pouco mais descontraída. Sendo que devia ser ao contrário. A outra foi uma visita de estudo. Esta é uma visita de puro lazer. Sei que andam muitas vezes largados, sem professores, à descoberta daquelas cidades espanholas, mas também sei que é largados que  criam mais responsabilidade, mais autonomia, e que alargam horizontes.
E por muito que custe (a esta mãe galinha), é bom vê-los à descoberta do mundo, a enriquecerem a alma, e a crescerem.