terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Balanço/Prenúncio

O balanço deste natal, é traduzido num quilo e meio a mais, nuns calções novos tamanho XS, oferenda dos meus filhos e que envergo hoje, assim a modos que à justa na zona abdominal, constato agora, que estou sentada há duas horas, e a sentir-me assim a modos, que quase a asfixiar.
O balanço que me ocorre neste momento é este, muita comida, bebida, muitos doces, e uma família reunida à mesa, sempre à mesa.
Amanhã teremos mais uma mesa farta, e uma casa cheia (quando é que eu me lembrei que a passagem de ano seria em minha casa? estaria doente? a alucinar?) de amigos, e comida, e bebida, e muitos doces, e palpita-me que mais um quilo e meio para começar bem o ano (e os calções XS na gaveta, à espera de melhores dietas).
Assim, feito o rápido balanço, e o rápido prenúncio, resta-me desejar um novo ano repleto de mesas fartas, com família e amigos, um bom fígado e um bom metabolismo, pronto a eliminar estas fartas ingestões, e blá blá, essas coisas todas que se desejam por estas alturas de viragem.   

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Reencontros (parte I)

Reencontros.
Foi um fim de semana de reencontros.
E de outras coisas mais.
Tantas, que não sei como um fim de semana tão curto, pode albergar tanto programa, tanta correria, tanto afazer (mas pode, deixou-me foi num estado de exaustão pura).
Foi um fim de semana de emoções, mas sendo que foram todas vividas a correr, porque os afazeres eram muitos, e a agenda estava preenchida milimetricamente, não tive ainda tempo de as assimilar, não tive se quer tempo de as viver convenientemente, de as mastigar, de as digerir,  tão pouco de pensar nelas, e senti-las em pleno.
 
Reencontros. Parte I 

Convidei o pai, o meu, a assistir ao jogo de sábado do miúdo. Senti que a frase "o meu pai" não era usada no meu vocabulário há muito tempo. Tanto, que ao proferir estas palavras, as senti estranhas, mal encaixadas, como não sendo minhas. O miúdo tinha manifestado o desejo de fazer um bom jogo, aos olhos de um avô que não via há três anos, e que poucas vezes viu, ao longo da sua vida. O avô assistiu a quatro golos do miúdo, e a uma exibição exemplar, no seu registo pouco expressivo.
O miúdo terminou o jogo, e cumprimentou o avô com um aperto de mão.
 
Despedimo-nos e combinámos novo reencontro para breve, já que a miúda não pôde estar presente, e não viu o avô. A miúda não perguntou como foi, como correu, nem como estava o avô. O miúdo perguntou apenas se o avô o reconheceu dentro de campo, ou tivemos de lhe explicar que era aquele pequenino com o número sete nas costas.
O avô reclamou em tom de brincadeira que o miúdo era pouco dado a beijos. Defendi o miúdo e tive vontade de lhe dizer que para o miúdo o avô não passa de um estranho, e que isto é fruto da relação que ele próprio plantou com uma semente tardia, raquítica, seca, mal plantada, sem rega, sem chuva, sem adubo, sem substrato. Uma semente que nunca passou de semente, embora saibamos que nunca é tarde para renascer (ou é?), assim a replantemos, e a tratemos com o devido cuidado. Para isto é só preciso querer. Querermos todos. E queremos ?

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Castigo

O miúdo está a passar a fase da parvoeira. Já o tinha dito. É que não me canso (ou estou cansada, mesmo) de o constatar.
Anda com a cabeça no ar, não ouve o que se lhe diz (ou finge que não ouve), está constantemente de castigo (aquele que lhe dói mais, as tecnologias todas enfiadas numa gaveta).
O castigo tinha acabado de ser absolvido. O pai diz-lhe que o vai buscar no dia seguinte, ao treino para irem juntos a um jantar de aniversário. Oiço as recomendações do pai, não ir equipado de casa, levar uma roupa, toalha de banho, chinelos, sair do treino a correr, tomar banho, vestir-se em condições, sair rápido, irem para a festa.
No dia seguinte, vou busca-lo à escola, e a mãe do amigo convida-o a irem juntos para casa, que os leva ao treino. Ele pede-me que o deixe. Digo que não. Tem um jantar de aniversário com o pai, não tem mochila para o treino, nem toalha, nem chinelos, nem roupa. A mãe do amigo (minha amiga também), diz não haver problema, tem equipamentos de sobra, arranjam-se umas chuteiras já velhas que caibam naquele pezinho de cinderela, arranja a mochila, com toalha e chinelos e afins. Olho para ele, e digo-lhe, escuta-me com atenção. Repito todo o discurso do pai. Ele diz que sim.
Acabado o treino recebo uma chamada do pai. Espumava pela boca, tenho a certeza. O miúdo tinha ido equipado para o treino, e enfiou toda a roupa dentro de uma mochila tamanho XS. E enfiou tudo, assim à sua maneira, bem enroladinho.  A roupa saiu com aspeto assim a modos que   atropelada por um camião. Pior, esqueceu-se dos ténis em casa do amigo, e das meias. E da toalha. E dos chinelos.
Imaginei a cena. Sem tomar banho. Roupa completamente amarrotada. Chuteiras nos pés. Sem meias. Eu ao telefone com os dois em alta voz, o pai ameaçava uma tareia, ele dizia baixinho "não tenho frio nos pés", eu anunciava novo castigo.
Chegou a casa já depois do jantar (onde se apresentou naquela linda figura), rabinho entre as pernas, pediu para dormir comigo (coisa rara).
No dia seguinte sou acordada com a seguinte frase "mãe, já conversei com o pai acerca disto, agora vou conversar contigo. quando eu fizer alguma coisa de errado, prefiro que me deem logo uma tareia do que me ponham de castigo" .

escusado será dizer que o miúdo não sabe o que é levar uma tareia apenas umas palmadas no rabo, e um puxãozito de orelhas, escusado será dizer que denunciou exatamente o castigo certo a adotar. tecnologias na gaveta, assim será.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

O sentido (do meu natal)

O natal está a chegar, e não me cheira a natal.
Perdi o olfacto natalício há três natais atrás, quando o meu rei passou a ex, e decidimos que esta noite seria dele. Sempre. Até entendermos o contrário.
E o meu natal, que até à data em que encontrei outra família, a família do meu rei, tinha apenas sentido no dia de natal em si, passou a ter sentido na noite também. 

Porque até então, a noite de natal não era propriamente vivida em nossa casa, assim como não eram vividas muitas outras coisas. Íamos para a aldeia, jantávamos em frente à lareira, nós e os avós, fazia frio, antes das dez recolhíamos aos quartos. Não havia presentes, a avó dizia "deixa o sapatinho na chaminé, pode ser que o menino Jesus te deixe uma nota". Não me lembro de alguma vez ter deixado o sapatinho, no dia seguinte recebia uma nota das mãos do avô. Depois tínhamos o dia, apenas o dia, com os avós, os tios e os primos paternos. Éramos muitos. E foi há muitos anos. Não me lembro o que comíamos, lembro-me apenas que havia gelatina. Porque me irritava  que a minha tia anunciasse solenemente que havia "treme treme". E eu nem era fã de gelatina, e fazia frio, tanto frio que a gelatina nem tremia. E depois trocávamos presentes,  desembrulhávamos papeis, e nós as miúdas recebíamos panos de loiça, naperons, utensílios para o enxoval. Ainda que estivéssemos a anos luz de um possível casório. E os miúdos recebiam peúgas, cuecas, e talvez outras coisas que não me recordo quais. O melhor dos presentes deixava-o para o fim. Sabia-o. O vindo da tia madrinha, seria o melhor. O primeiro diário com direito a cadeado, com folhas decoradas e cheiro a alfazema. A caixa de música, com a bailarina que não se cansava de rodopiar em cima de uns poucos centímetros quadrados de espelho. Os blocos de folhas coloridas. Mas o melhor, o melhor presente de todos, recebia-o antes do natal. O que não era surpresa, porque escondido em cima de um roupeiro semanas antes do natal, era minuciosamente espreitado, entre o descolar de uma fita cola, ou a transparência de um papel.  O que era oferecido antes de sairmos de casa para a aldeia, a surpresa aniquilada pela minha própria curiosidade. A cozinha de brincar. O ferro de engomar, com direito a tomada eléctrica e tudo, a pantera cor de rosa, o bebé chorão. Um, e apenas um presente, por natal, um de cada um, não mais do que isso, a alegria de os receber.  

Depois os natais na aldeia foram escasseando. O avô paterno adoeceu, perdeu-se o almoço gigante, com direito a enxoval e gelatina treme treme. O avô partiu, e logo em seguida, para outras paragens, ainda que terrenas, partiu o pai. E o natal passou a ser a três. Nós três. As três mulheres da casa. 

Depois conheci o rei. E com ele, o cheiro a noite de natal. A ceia tradicional, os doces tradicionais, a troca de presentes um pouco antes da meia noite. Porque vieram os filhos, e com eles essa alegria, do pai natal que não conseguiu chegar a casa de todos os meninos, mas que ligou e que se despediu com um caloroso ho ho ho, e com a autorização da abertura dos mega presentes. 

E depois perdi esse sentido. Esse cheiro a noite de natal, há três natais atrás. E voltei a ficar com o dia. Apenas o dia, sem os avós de outrora, mas ainda assim com o avô materno, sem os tios, os primos, sem o enxoval e a gelatina treme treme, mas com os filhos, os meus, o sentido de tudo, onde tudo ganha sentido. 

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Três

Não estive todos estes dias ausente, embrenhada na leitura. Não. Essa arrumei-a em três dias, meio livro numa noite, um quarto de livro  noutra, e o outro quarto na manhã seguinte, a ânsia de o terminar. Serviu então fim de semana prolongado para descansar? Não. De todo. O sobrinho fez anos, três. O auge da infância, em que tudo o que dizem tem graça, em que é tudo puro, sem malícia, em que as bochechas se tornam ainda um alvo fácil de agarrar e devorar. O sobrinho fez anos, e embora tenha um medo terrível de ouvir cantar os parabéns (vá-se lá saber porquê), comemorar era preciso. E comemorou-se não com um, mas com dois jantares. Assim, a tia ajudou na comezana, e na confecção do bolo (já andava um bocado destreinada da massa de açucar, mas não ficou mal de todo, e acho mesmo que miúdo adorou). Depois destes dois jantares, seguiu-se um jantar de natal. Daqueles em que amigos se reunem, comem e bebem, trocam presentes secretos, comem e bebem, e riem, e comem e bebem. Três noites de grandes jantaradas, portanto. E em todos estes dias, a alvorada foi cedo. Bem cedo. Três manhãs de futebol do miúdo. Não foi uma, nem duas, como inicialmente previsto, foram três. 
Três dias para ler um livro. Três dias de fim de semana. Três anos do miúdo. Três jantares animados. Três jogos de futebol. Três dias para recuperar. Vou no segundo. Amanhã, estarei em forma.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Embrenhada/Absorvida, e outros sinónimos que tais


Estou tão embrenhada na leitura, que não me apetece escrever nem fazer mais nada
Era só para avisar.
 
(obrigada a quem me recomendou emprestou o dito)

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Retrospectiva (11)



Olho para trás, para o mês que findou.
Fiz alguns almoços de sábado, para quase uma dezena.
Assisti a sete jogos do miúdo. Algumas derrotas. Algumas vitórias.
Assisti a duas actuações de dança da miúda.
Fiquei orgulhosa dos dois.
Ouvi numa reunião de pais coisas menos simpáticas do miúdo.
Não me orgulhei do que ouvi (embora não fosse nada de grave).
Dei vários sermões ao miúdo.
Consolei a miúda pelas notas menos boas.
Fui a um jantar e a um almoço de aniversário, os dois, do mesmo aniversariante (e senti-me lisonjeada por ser a única amiga repente nos dois eventos - mesmo que tenha sido só pela proximidade geográfica).
Encerrei um capitulo na minha vida, que achei que não tinha "pernas para andar".  
Magoei  (ou fraturei) o coxis, o que me levou ao hospital.
Tomei dezenas de analgésicos, não respeitando o horário a intervalar entre cada um.
Constipei-me e não liguei nenhuma.
Dormi mal durante quinze dias, por causa de um coxis magoado, e de uma tosse incontrolável.
Estive quinze dias sem conseguir conduzir, andando a "reboque" do ex-rei, da amiga e de um colega.
Fui à aldeia, visitar o avô, que em cima dos seus quase noventa anos, ainda anda de mota.
Fui ao cemitério e visitei as campas dos avós que já partiram.
 Interrompi as habituais corridas caminhadas com a vizinha por causa de um coxis magoado.
Cimentei o aprender a gostar de vinho tinto.
Felicitei a miúda, pela melhoria de algumas notas.
Fui ao cinema com os miúdos.
Dormi no cinema, mesmo o filme sendo de ação.
Adormeci no sofá quase todas as noites.
Quase todas as noites fui acordada no sofá pela miúda, que me mandou para a cama.
Retomei as caminhadas com a vizinha por me dizerem que fazia bem a um coxis magoado, e o cão foi atacado por outro cão muito maior.
O cão levou quatro agrafes na barriga, e a toma de analgésicos e afins foi redobrada lá em casa.
Convidei o sobrinho de quase três anos a fazer a árvore de natal connosco.
Voltei a revirar toda a arrecadação para poder retirar todas as caixas com enfeites natalícios, e amaldiçoei toda a tralha acumulada.
Fiz com os filhos e o sobrinho a árvore de "natau" (como diz o sobrinho), e com pouco espirito natalício, deixei alguns dos presépios dentro das caixas, e voltei a coloca-los na arrecadação.
Decorei a casa com apenas quatro presépios dos muitos que tenho.
Decidi fazer uma jarra com azevinho falso, e não ir apanhar verdadeiro ( deixei para dezembro a hipótese de que o espirito natalício  desça sobre a minha pessoa, e  o vá apanhar mais tarde)   


segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Por mais estranho que possa parecer

Ontem li sobre um caso de alienação parental em dois dos blogues que acompanho ( aqui e aqui ).
Não sei as razões que levaram a mãe do pequeno Santi, a impedir o pai de ver o filho. Não sei, mas perante tantos casos que ouvimos ou presenciamos, parece-me sempre injusto. Porque os filhos, nunca têm culpa. Nunca. E os adultos por vezes esquecem-se disso, fazem dos filhos armas de arremesso, metidos numa guerra alheia e incompreendida. E os pais sofrem, mas vivem essa luta sem olhar e perceber (?) que os filhos sofrem muito mais.
Eu separei-me há dois anos. E ainda hoje oiço das mais variadas pessoas o quão estranha é a relação com o pai dos meus filhos. Estranha ? pergunto-me. Aos olhos de muitos, provavelmente sim. Aos nossos, nada. E aos dos nossos filhos, tenho a certeza que muito menos. O pai dos meus filhos foi a pessoa com quem escolhi casar, com quem partilhei quinze anos da minha vida. Se erros houve, pouco interessavam no momento em que decidimos colocar o ponto final.  O importante seria minimizar os estragos, perante os dois seres mais importantes das nossas vidas, que culpa não tinham desses erros, e que a sofrer (porque sofrem sempre) que fosse o mínimo que conseguíssemos.
Assim, os filhos ficaram comigo, e não temos nem nunca tivemos um regime de visitas definido. Nem de fins de semana partilhados. São  diversas as vezes que perguntamos um ao outro "este fim de semana é teu ou é meu?", porque nunca sabemos, porque vamos gerindo, porque ele praticamente vê os filhos todos os dias, porque os filhos também  têm voto na matéria e também optam com quem lhes dá mais jeito ficar aos fins de semana  em função da agenda social ou do estudo, porque eu não me importo, porque ele, o pai, não se importa, porque vamos juntos assistir ao futebol do miúdo, porque vamos juntos assistir à dança da miúda, porque se preciso for, e se nos der na real gana, fazemos refeições juntos. Porque a noite de natal por ter sido sempre em casa dos avós paternos, e por saber que era assim que os meus filhos gostariam que continuasse a ser, abdiquei de estar com eles nessa noite, e assim tem sido, e assim será novamente este ano (por muito que me custe), e porque o pai não tem família próxima, e me traz os filhos para passarem o dia comigo, passa também ele o dia connosco e com a minha família. Porque a nossa família se adaptou ao nosso regime, porque os nossos filhos estão bem, apesar de saberem que os pais não estão juntos, que têm vidas separadas (conhecem e convivem inclusive com a namorada do pai), porque nós estamos bem assim, porque entendemos ser o melhor e o mais saudável para todos, principalmente para eles, os filhos, os mais importantes na caminhada da nossa vida, ainda que separada.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Para não esquecer

Esta semana tivemos o dia pela erradicação da violência contra a mulheres.
E eu lembro-me. Não me lembro como se fosse ontem, porque me parece que foi há uma eternidade atrás (e foi), mas há coisas que não se esquecem, e ficam guardadas no recôndito da tua memória, para que saibas e te recordes que as viveste, que aconteceram, que não vais permitir que de novo aconteçam.
Começou por ser um namoro bonito, ele pouco mais novo, eu maior de idade. Eu gostava dele, ele gostava muito de mim. Mas gostava muito, tanto, que esse gostar se transformou numa obsessão doentia, misturada com ciúmes doentios, a acrescentar atitudes mais doentias ainda.
A primeira vez que me bateu, respondi na mesma moeda. Eu, a miúda espevitada, senhora do meu nariz, era só o que faltava, alguém me encostar a mão. Terminei tudo, não admitia, sabia como era, sentia que nunca mais, nada iria ser como antes. Aquela atitude tinha quebrado toda e qualquer confiança que pudesse ter, naquele que era o meu namorado. O respeito tinha terminado ali, de parte a parte. Mas ele gostava muito de mim. Mas gostava muito, tanto, que chorou baba e ranho, implorou contra a minha decisão, jurou que nunca, jamais, voltaria a ter uma atitude semelhante. E eu, julgo que de alguma forma ciente de que aquela jura poderia não ser cumprida, ainda assim, voltei atrás.
Não muito tempo depois, e desta vez em publico, aconteceu novamente. De uma forma mais brusca, mais violenta, de modo a que eu, a miúda espevitada, senhora do meu nariz, me tenha visto naquele momento com o dito no chão, o orgulho, a auto estima, e as forças quase inexistentes. Queres apresentar queixa, perguntaram-me. Não queria, não queria relembrar o momento, não queria assumir e tornar publico que tinha errado, principalmente perante a minha mãe. Eu, a miúda espevitada, senhora do meu nariz, deixar que me agredissem, física e psicologicamente, era algo que eu não queria jamais transparecer. A mãe soube, os amigos souberam, eu sozinha percebi que o erro não era meu e disse o basta. Percebi que ele não gostava muito de mim. Que não gostava muito, tanto, porque gostar não é assim. Percebi que a vivencia que tinha tido, assistindo a atos semelhantes vindos do pai e do irmão, não lhe davam o direito de ser igual. E eu não podia, não queria ser mais uma vitima daquela família insana.
Fui perseguida nos sete meses seguintes. Presenciei cenas de choro, pedidos de desculpa infinitos, alternados com revolta e ameaças. Não cedi, e qual senhora do meu nariz, muitas vezes envergando uma falsa máscara, mostrava não ter medo. E as perseguições foram escasseando, os pedidos de desculpa deixaram de existir, de quando em vez nova ameaça. E eu rapidamente me reergui, coloquei o acontecimento no passado, continuei a viver o meu presente.  
Mas muito de vez em quando, lembro-me. Não como se fosse ontem, porque me parece que foi há uma eternidade atrás (e foi), mas há coisas que não se esquecem.  Para que saibas e te recordes que as viveste, que aconteceram, que não vais permitir que de novo aconteçam.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

um quadradão (machista) do pior #3

Já tinha dito aqui ( e aqui, e ainda aqui ), que o meu miúdo é um quadradão do pior.
Também já tinha anunciado por aqui que o miúdo está apaixonado, e passa a vida a trocar mensagens com aquela que lhe tomou de assalto o coração.
Enquanto trocava mensagens freneticamente (com ela, suponho), pergunta-me:
-oh mãe, tu achas que eu sou machista? - nunca pensei que este dia chegasse tão cedo, confesso, e soltei um "claramente" convicto machista é até bem mais adequado do que quadradão, bendita miúda que lhe vai abrir os olhos .
-e uma pessoa pode ser presa por isso?

(e eu parva, disse que não...)

Assim assim

Há os dias bons, os dias maus, os dias assim assim.
Não sei em que categoria enquadre o dia de ontem.
Uma manhã boa, uma tarde assim assim, uma noite má.
Depois de uma manhã boa, à tarde oiço dizer coisas menos boas de um filho, chego a casa, já quase sem forças para repetir o sermão que tem de ser dado (impreterivelmente), olho para o relógio, acelero o jantar que a hora da caminhada aproxima-se (e já que me dizem que caminhar é bom para o coxis, vamos a isso), faço um bacalhau com natas em meia hora, com direito a batata  frita verdadeira e tudo, enfio o fato treino, saio para a rua, acompanhada pela vizinha, pelo cão dela e pelo meu. Trabalhar a musculatura e o esqueleto a cães e seus donos, é a palavra de ordem. O frio gela a face, o coxis aquece, as dores diminuem, acelera-se o passo.
O percurso é diferente do habitual, encaminhado pela vizinha, cortamos caminho pelo campo de golfe. Tento olhar para a paisagem, mas está escuro que nem breu e a lanterna  fixa na cabeça da vizinha não é suficiente para grandes iluminações. Aparecem dois cães, sozinhos, de grande porte. A vizinha conhece-os, sabe onde vivem, devem ter fugido, diz-me.
O meu cão, um pingente canino com menos de três kilos, não gosta dos forasteiros, rosna, ladra, qual cão de guarda, atira-se ao maior. Numa questão de segundos, vejo a vizinha no chão, numa mão a trela presa à cabeça do meu cão, na outra ponta o cão grande com o meu cão abocanhado. E o que é que uma pessoa faz perante um cenário destes? Grita: "ai, que me vão matar o cão!". Não sei se foi o meu grito que surtiu o efeito desejado (palpita-me que não), o cão grande largou o meu cão pequeno, e com ele ao colo e sem luz (a lanterna perdeu-se no meio do aparato), voltámos a casa para avaliar os estragos. Cão de urgência no veterinário, quatro agrafes na barriga, injeções e medicação prescrita, cento e vinte euros largados. Sinto-me como se eu própria tivesse sido abocanhada por um cão, dói-me o corpo, parece que levei uma tareia. Penso,  podia ter sido pior. Assim, talvez tenha sido só... assim assim. 

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

discurso/ladainha/recomendação

A chegada das avaliações intercalares a casa, é sempre um momento de algum suspense. Uma pessoa anseia pelas boas novas, por ver melhorias, mas no fundo, no fundo, sabe que o discurso se vai repetir, a mesma ladainha, as mesmas recomendações.
Em todas as disciplinas a queixa se repete, distração é a palavra de ordem.
Ao fim de uns anos, uma pessoa começa a habituar-se ao mesmo registo, o discurso começa a ser menos veemente, a ladainha repetida com menos convicção, as recomendações de ver melhorias já amanhã, e sempre.
A preocupação constante de à distração não ver acumulada a cruz na falta de educação, e menos mal, uma pessoa pensa.
Depois lê a nota em rodapé. Respeitar as regras em sala de aula, como por exemplo, respeitar a sua vez no ato de participar. E notas em rodapé é algo a que uma pessoa não está habituada, e então o discurso alonga-se veementemente, a ladainha altera-se ligeiramente, as recomendações redobram-se. E uma pessoa percebe que o miúdo pode ser distraído, mas ganha a olhos vistos poder de argumentação, que também sabe discursar com alguma veemência, que a sua ladainha defesa é cada vez mais minuciosa, e que isto afinal de contas na vida, é-se preso por ter cão e preso por não ter. Se uma pessoa participa é porque participa, se uma pessoa não participa é porque não participa, e afinal de contas, o que é importante, são as notas, e essas, não foram más (pois não?). Uma pessoa consegue ouvir atónita todo o discurso e ladainha defesa apresentada, e reformula novo discurso, nova ladainha, novas recomendações. E espera por melhorias (e tem dúvidas se distração é um mal genético).

Não me vergo

Cinco dias volvidos, àquela a que denominaram "lesão" no coxis, continuo a sofrer à séria, e começo a desconfiar de um diagnóstico mal feito. Pouco importa, já que o local lesado, fraturado ou não, não tem outro remédio se não esperar, camuflar a dor com muitos analgésicos e muitos  anti-inflamatórios, rezar para que os mesmos não provoquem uma úlcera no estômago, para além do desarranjo intestinal já provocado e pedem-me repouso. Muito repouso.
Assim, tenho repousado durante a noite, aquele que é possível, porque as dores não me deixam fazer um sono descansado e tranquilo. Tenho a sorte de ter um ex-rei que todas as manhãs me vem preparar almoço e lanches das crias, me dá um jeito na casa, me transporta até ao meu local de trabalho, onde repouso, a trabalhar. Tenho a sorte de ter amigas que me providenciam o regresso das crias a casa, a quem tenho de alimentar, e por isso repouso em frente ao fogão. Depois sei que a tulha da roupa deve estar já atulhada, faço uma máquina, tenho a sorte de ter uma mãe que vem dar uma ajuda, e uma irmã que se oferece para ajudar, embora eu diga a todos que isto está melhor. Não está. Mas repouso absoluto, é algo a que não me posso dar ao luxo, a que não me quero dar ao luxo, não é o raio de um coxis que nem falta nos faz, que me vai vergar (é que vergar, é mesmo o movimento que não consigo de todo, fazer).

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Ridículo (e doloroso)

E quando uma pessoa está há três dias sem se mexer, três noites sem dormir, com dores no coxis de levar às lágrimas, aos "ais" "uis" e outros gemidos que tais. E uma pessoa chega ao hospital, sabendo que fraturado ou não, é indiferente, que não há conserto possível para tal, mas só quer uma injeção na veia para acalmar o sofrimento, e o médico verificando a agonia, lhe pergunta "então como é que caiu?" e uma pessoa fica na dúvida se mente descaradamente, e diz que caiu na banheira, ou na rua, ou escorregou no chão molhado da cozinha, ou conta a verdade, nua e crua, e explica ridiculamente que o seu filho escondeu o Ipad entre os dois assentos  do sofá, e que uma pessoa se sentou descontraidamente e com alguma força em cima do mesmo, com uma pontaria certeira, que lhe deu cabo do coxis, desta maneira. E uma pessoa conta a verdade, mesmo sabendo o quão ridícula e difícil de acreditar é , e uma pessoa encharca-se em analgésicos e anti-inflamatórios e outros medicamentos que tais, enquanto ouve o filho dizer que foi preciso muito azar, porque ultimamente tem sido aquele, o esconderijo do seu Ipad. E uma pessoa fica na dúvida se chora, se ri, se dá uns açoites no miúdo, ou se felicita a Apple. É que o material é bom. Rijo e resistente. O meu coxis, acabou de constatar isso.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Para ti J. que fazes anos hoje

Caríssimo J, que faz aninhos hoje, 
Uma vez que não irei ter tempo de comprar-lhe nada, como oferenda de aniversário, dado que passa já das quatro da tarde, e sei o quão entupida fica esta avenida, a partir desta hora, ainda mais a uma sexta feira, venho por este meio, deixar uma informação que achei útil, para sua excelência. Respira. Que esta frase foi longa, apesar de bem calculadas as virgulas (não as calculei ao milímetro, pu-las assim, conforme me foi dando na real gana, mas é capaz de não terem ficado mal de todo).
Respiraste ? Não tenhas nenhum ataque, muito menos no dia de hoje, que o pessoal quer comer o arroz de pato. Aquele que não é igual ao meu (bolas, que eu faço aquilo bem, assim com'ássim, ainda faço algumas pequenas coisas bem, na real p-u-t-a da minha vida) mas que a tua mulher diz que eu hei-de dar a mão à palmatória, que não sendo igual, é igualmente bom. Vou preparadíssima para dar as duas mãozinhas, se preciso for. As duas palmas, das mãos, estendidas, que às vezes (muitas vezes) teimamos uma com a outra, num claro sinal de teimosia crónica (logo, incurável), mas que, quando revejo razão do lado contrário, às vezes a custo, não me inibo de as estender (as palmas. das mãos. ou de uma só, se me custar um bocadinho mais. dar a mão. à palmatória - se é que me fiz entender, que isto a escrita às vezes sai-me assim fluida, e por vezes com pouco nexo).
 
Pronto, estas balelas todas, aqui de enfiada, para dizer apenas que não terei tempo de te comprar nada, mas não fica no esquecimento. No entanto, enquanto fazia tempo para receber uma porra de um email, que não há meio de chegar, e eu quero bazar daqui, antes que apanhe cinco quilómetros de transito parado, e gaste dez ou quinze litradas de gasóleo de uma assentada só, andei a passear-me pelo facebook. Essa ferramenta que vocês não têm, e não sabem o que perdem, o que se aprende por ali, o que se vê, o que se lê, enfim, a magnificência da coisa é tal, que acabei de descobrir a cura para o nosso mal comum (bem, o meu, assim como a teimosia, é crónico, mas pode ajudar, e eu, que cuidada sou com as minhas questões de saúde, estás a ver , vou já seguir todos os passos à risca.
Assim, aqui fica o link para  a cura do nosso mal:
 
 
Este é o meu presente de hoje, para ti. E não digas que vais daqui.
Sei que o discurso está meio disforme, e no meio deteto um erro ortográfico, que a porra do dicionário automático teima em sublinhar a vermelho, mas o estupido (do dicionário) não me dá outra opção que eu considere válida. Assim, "HEI-DE" não se escreve assim? Atão, porra, é como? é tudo junto? Perdoai-me a ignorância, mas vou recorrer ao dicionário em papel, mais logo. Que deve estar ultrapassado. Depois do acordo ortográfico. E uma pessoa anda assim, sempre às aranhas. Sem saber às quantas anda, no que às letras diz respeito. Se calhar vou publicar na minha página do facebook, a questão. Que isto quem tem face, tem tudo. Até a solução para a sinusite.
 
Basta. Vou-me embora. O arroz, que até vai saber a pato, espera-me. Assim como o gin. Estou a precisar, hoje. E de repente até me ocorreu a ideia, de fazer esta mézinha, esta receita para a sinusite, com gin. Era capaz de surtir efeito. E deixar-me inebriada para o resta da vida. E isso, parece-me uma excelente ideia, neste momento.
 
Um beijo de parabéns, pelos anos que fazes, pelos anos que tens feito a minha amiga feliz, por seres quem és. Vais no bom caminho. Venham mais 46 iguais (pronto, eu sei que não é possível em todos os aspetos, mas para isso, pode ser que eu arranje a receita no facebook, para o ano) !
 
Até já.
(este texto foi escrito ao abrigo de uma pressa de sair daqui para fora, logo, não foi lido e relido, podendo ter outros erros ortográficos, ou não ortográficos, ou coisas que tais)

De coração acelerado

Tenho o miúdo apaixonado. No cimo  do seu metro e quarenta,  dos seus trinta e um kilos, a denunciarem um físico de  dez anos (no máximo), mas numa cabeça e num coração  de doze anos e meio, o miúdo está apaixonado.
Questionei a melhor amiga, de quem seria a feliz contemplada, não obtive grande informação, mas a menina feliz contemplada depressa se denunciou quando apareceu na bancada para o ver jogar.
Qual mãe sogra cusca consigo perceber que não andam na mesma escola (ufa, ufa, respiro de alívio), ainda me pergunto como se terão dado ao conhecimento dados os largos quilómetros que os separam, penso na internet, o raio da internet, percebo que têm amigos em comum (ufa, respiro de alívio). Olho de soslaio para a miúda, não quero dar nas vistas, informam-me que tem também doze anos, constato que o miúdo não é parvo de todo, porque são uns doze num corpo de dez  há que saber estar à altura, na verdadeira aceção da palavra. Consigo até achar-lhes algumas parecenças físicas, passavam bem por gémeos, melhor do que muitos gémeos que conheço. Faz-me confusão.
Olho de novo, de soslaio, penso que é esta meia leca de miúda, que me tem levado o miúdo a ficar horas fechado no quarto, agarrado ao telemóvel, que é a ela a quem dá o primeiro bom dia, ainda com um olho meio fechado, meio aberto, que é a ela a quem dá o ultimo boa noite, quando se enfia na cama com o telemóvel refundido, e eu finjo que não vejo.  
Ontem a caminho de casa, oiço a seguinte retórica:
"olha mãe, escusas de andar a tentar sacar informações da minha vida pessoal, com os meus amigos. os meus amigos, são meus amigos, e contam-me. escusas de olhar para ela, quando a vires a ver os meus jogos (julguei que tinha só olhado de soslaio) se quiseres saber alguma coisa da minha vida, pergunta-me. mas eu não tenho nada para te dizer. se eu te quiser contar alguma coisa da minha vida, eu conto-te. mas eu não tenho nada para te contar. e não penses que algum dia vou ser como a mana, que se deita contigo na cama e te conta o seu dia."
Oiço, calo, registo de estômago revirado.
Deixar o coração dele acalmar, desacelerar, e conversamos depois, penso. e enquanto isso, tenho tempo de organizar o discurso, que ainda não sei qual é.
 

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Quem sai aos seus...

E a propósito desta minha parvoíce aqui constatei (uma vez mais) que o miúdo, o meu miúdo, sai mesmo à mãezinha dele.
Depois de ter seguido do seu jogo de futebol matinal para casa de um amigo, onde passou toda a tarde, fui busca-lo.
Vi nele um certo frenesim para vir embora (o que não era de todo normal, que são sempre só mais cinco minutos, que ainda falta marcar o ultimo penalti), aquando estava eu ainda na conversa com os pais do amigo, a agradecer e blá, blá.
Entramos no carro, e ele diz:
-mãe, arranca rápido. rápido.
-mas então? aconteceu alguma coisa? não gostaste ?
-claro que gostei. mas é que desde que acabou o jogo que estou aqui com o cocó mesmo à beira, pronto para sair, e tu sabes que eu não faço isto em casa de ninguém.
 
(como eu entendo... nada como largar o demo na paz do nosso santo lar)

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Toldado


 
(não sei onde começa. não sei onde acaba. o meu coração.  toldado pela razão. toldado pela emoção.)

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Mesmo nos dias mais negros...

"You can't have a rainbow without a little rain..."
 
 
(mesmo nos dias mais negros, há um arco-íris colorido...)

sábado, 1 de novembro de 2014

Eu juro que foi ontem



Eu juro que foi ontem. Foi ontem que descobri esta tradição vinda de outras paragens, que esculpi abóboras e coloquei à porta, lanternas perfeitas, que decorei a casa, que os acompanhei no doce ou travessura, escondida atrás dos arbustos, enquanto eles batiam de porta em porta, diziam a célebre frase enquanto esticavam o saco, que se enchia de doces variados. Foi ontem. Juro que foi ontem. Eu escondida, eles mascarados de bruxas e vampiros, felizes. Eu no encalço de que nada de mal lhes acontecesse, aos meus e aos dos outros ao meu encargo, que nisso os meus, sempre foram peritos em ser os anfitriões. Doce ou travessura? Só havia doces, porque mesmo para os desprevenidos que nada tinham a oferecer, não havia travessura na manga, apenas um "oh" denotando tristeza, e a convicção de que na próxima porta seriam duplamente recompensados. Eu juro que foi ontem, que regressámos a casa cansados, mas eles extasiados, a contar o número de doces ganhos, e eu a pensar o que fazer a tanta iguaria doce.

Eu juro que foi ontem, que eles me destituíram dessa função, de os acompanhar, que me informaram da autonomia em atravessar uma estrada, da prática nas casas dos simpáticos e cheios de pastilhas e gomas, e das casas onde nem tocavam, os antipáticos do ano passado, que nada tinham e resmungavam, e que iriam sentir na pele, a travessura de uma bombinha de mau cheiro.
Eu juro que foi ontem, que eles regressaram a casa cansados, mas extasiados com sacos repletos de açucar.

Eu juro que foi ontem, que eles ignoraram as máscaras, nada de bruxas nem vampiros, que isso eram coisas de meninos, o que interessava eram os doces, e as travessuras, e a algazarra, e o convívio com os amigos, ruas abaixo, ruas acima, e que regressaram a casa cansados, extasiados com os sacos de doces, fazendo de imediato uma escolha e a separação dos  preferidos.

Eu juro que foi ontem (e foi mesmo), que a mais velha me pediu para fazer o doce ou travessura nos bares em Santos, que por de doce não ter nada, e eu prever travessuras impróprias para quinze anos não deixei. Que o local se manteve o mesmo para os dois, que a hora de regresso se estendeu muito mais do que "ontem" e "ontem" e "ontem", que regressaram a casa, ela reclamando ter sido uma seca "o pior halooween de sempre", ele extasiado com o seu grupo de amigos, impregnando um cheiro a vinagre entranhado em toda a roupa, cabelos oleados com maionese, nem um único doce, só e apenas travessuras entre amigos "o melhor halloween de sempre".

Eu juro que foi ontem, que os tive assim pequeninos. Juro. 

As artes não são a nossa praia

Cedo se descobriu cá em casa, que nenhum dos meus filhos nasceu com dotes para as artes. A "coisa" até pode ser trabalhada, mas aliada à falta de jeito, junta-se a falta de gosto, e a combinação das duas traduz-se numa mãe a tentar ajudar que a nota de educação visual/tecnológica, não seja uma nódoa completa. O professor, um dinamizador (como não há muitos) dá hipóteses de subidas de nota, com trabalhos extra, em alturas especiais do ano. Assim, no Halooween, aos do 7º compete levar uma vassoura assustadora, aos do 8º uma abóbora horripilante, aos do 9º transformar uma sala de convívio, numa autentica sala de terror. A participação não é obrigatória, e por essa razão (e por ser caloira na matéria), no 7º da miúda, nem chegou a informação devida a casa. Não houve vassoura, consequentemente, nada de melhoria de nota. No 8º, já precavida, trouxe-me um honroso terceiro lugar com a abóbora horripilante (que de horripilante nada tinha, e até estava a modos que fofuxa). No 9º empenhou-se com a banda sonora para a sala do terror, que permanece até hoje na minha lista de músicas do meu telemóvel, e que por não as conseguir eliminar sem apagar tudo o resto, de quando em vez ainda me pregam um susto. 
Este ano, já batida na matéria, e com a miúda fora destes filmes (erradicou-se de vez essa disciplina na sua vida académica ), em cinco minutos engendrei uma vassoura assustadora, o miúdo (mero espectador na questão) aprovou a obra de arte (fosse ela qual fosse), levou a vassoura sem grande entusiasmo, e no fim, recebi a queixa do professor de que todos os rapazes ( o meu incluso) se recusaram a dançar com a sua obra prima.

(eu, também não teria dançado...)



(as abóboras/vassouras dos outros alunos - pais )

E abaixo, a nossa abóbora vencedora de há dois anos (mérito da tia que forneceu da sua horta, uma abóbora formato anoréctico)


Futebólódependentes anóminos #2

Quando eu escrevi que devia fundar os futebólódependentes anónimos e que o meu filho devia ser membro do mesmo, não estava a brincar. 
Ontem recebeu o teste de inglês.
A composição rezava assim:

"Hello, my name is xxxx. I'm 12 years old, I'm from Portugal, so, I'm portuguese o que foi uma óptima conclusão, sem dúvida. I live in Lisbon bem, não vive em Lisboa, mas o distrito é esse, portanto, vá, escapa . I love to live in Lisbon, because you can see many football stadiums, like estádio da luz and estádio de alvalade."

O estádio de alvalade, deve ter-lhe custado a escrever, mas não fosse a professora ser sportinguista ferrenha e cortar-lhe mais uns quantos valores por isso, e por esta maravilhosa descrição acerca da cidade de Lisboa, assim ficou. Um orgulho.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Dar valor às fórmulas (não) perfeitas

Na escola colégio dos meus filhos, há uma reunião por mês. Podemos queixar-nos de muita alguma coisa, de falta de informação, não. As reuniões são a horas muito pouco propícias (16:40), o que faz com que a maioria dos pais nunca ponha lá os pés. Eu, que por hora consigo agilizar os meus horários, vou sempre. O miúdo, agora no sétimo, está a conhecer todos os professores que até há uns meses foram da irmã (sendo que alguns, dão aulas aos dois).
Vou primeiro à directora de turma dela. Que também é professora dele. Pergunta-me para começar "então, o que me tem a dizer?", respondo-lhe na mesma moeda "o que me tem a dizer pergunto eu". Não havia muito a dizer. A miúda está aplicada, igual a si mesma, no seu registo sossegado em género "não se metam comigo, que eu não me meto com ninguém", que é como quem diz, estou aqui tão sossegada, não me perguntem, não me façam participar (muito menos em debates filosóficos, que eu não percebo nada desta porcaria, e o que me havia de calhar agora na sopa).
Oiço pela quinquagésima vez o quão diferentes são os meus dois filhos. Não preciso que mo digam. Constato o facto todos os dias. Fisicamente o oposto, personalidades opostas.
Ele participa constantemente sem pôr o dedo no ar "não sei qual é o problema, se uma pessoa não participa, é porque não participa, se uma pessoa participa, é isto? devias era estar orgulhosa de mim!", ele conversa até com o lápis (não sem antes o trincar até ao tutano), e depois tem um azar dos diabos, porque nunca fala, e da única vez que o faz, é apanhado. Um menino azarado, o meu filho. E depois, dizem-me que é muito educado, que pede mil vezes desculpa, e que é tão engraçado, que até se torna difícil repreendê-lo (como eu compreendo o dilema). E as notas vão surgindo, naquela média dele do quatro, com pouco quase nenhum estudo, o inverso dela que se farta de trabalhar, para o conseguir. O mix dos dois, era a perfeição, mas não há fórmulas perfeitas, e bem vistas as coisas, se assim fosse, também não tinha piada nenhuma. 

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Vale a pena mentir (às vezes)



"Está na altura das broas",diz-me a minha mãe."Se hoje estivesses com paciência, fazíamos uma fornada. O teu forno é melhor que o meu, despachávamos isto num instante".
Não estou com paciência, como aliás não tenho tido, para quase nada. Minto, faço o esforço, penso. Até é capaz de me fazer bem. 
"Temos de fazer uma quantidade valente", diz-me. A quantidade que quiseres, penso. E até podemos fazer a receita que a vizinha do lado me deu o ano passado, e fazemos render o peixe.Afinal, a fornada valente, destina-se a umas quantas pessoas "temos de dar à tua irmã,à vizinha da tua irmã, à tua amiga, à tia, à madrinha, à vizinha que te passeia o cão, e à vizinha do lado, que também te deu o ano passado".
Num instante o cheiro a canela e erva doce invadiu a casa. Não num instante, mas numa tarde inteira, saíram do forno dezenas de broas de duas qualidades diferentes.
.
Numa tarde, mãos de três gerações distintas (mãe, filhas, neta) com a mesma desenvoltura, moldaram bolinhas de massa crua, numa cumplicidade saudosa.
Por vezes vale a pena mentir, e fazer um esforço.


Infinito. Sempre

A minha amiga, que tem uma filha, amiga da minha filha, e que por sua vez são da mesma turma, ligou-me:
-A tua já te ligou?
-Não. porquê? A tua ligou-te?
-Ligou. Já receberam a nota de português.
-E então?
-A minha teve dezoito, mas disse que não sabia a nota da tua, que tinha ido à secretaria e não tinha tido tempo de lhe perguntar.
-Hummm... não acredito nisso. A minha teve nega, de certeza. E isso foi desculpa.

Liguei. Não me atendeu. Mandei mensagem "filhota, então a nota de português? Um bj. Gosto muito de ti"

Duas horas depois, retribui-me a chamada:
-Olha mãe, não tive nega, não penses. Aquele teu "gosto muito de ti", foi mesmo do género, "mesmo que tenhas nega, não te vou expulsar de casa"... Tive uma treta de um doze.

Nunca me chateei  seriamente com uma nega (das poucas que recebeu ao longo da sua vida académica) desde que reconhecesse não ter sido por falta de empenho (o que neste caso, não seria, de todo), portanto concluo que não tenho dito tantas vezes (como outrora) o quão gosto dela(e). E que as notas,  melhores ou piores, não condicionam jamais o amor infinito que nos une. E que acima de tudo, só quero que sejam felizes.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Mentira. Pura mentira

Uma pessoa quando compra uma casa (ou a aluga ao banco - como quiserem - mas acha maravilhoso para o país, fingir que a casa é sua e pagar esse filha da puta do IMI ao estado), na maioria das vezes fá-lo porque necessita de mais espaço. Foi o meu caso, há uma parga de anos atrás.
Olha que bonita, esta sala espaçosa e airosa, uns quartos simpáticos, um terraço fantástico, uns roupeiros porreiros, muita arrumação, falta-lhe apenas uma despensa. Um mal menor. Um mal menor, quando se tem uma fantástica arrecadação com alguns dezassete metros quadrados. Um mimo. Problemas de espaço, é que não vamos ter.
Mentira. Pura mentira. Ao fim ao cabo, depressa se chega à conclusão, que a roupa está a modos que prensada dentro do roupeiro, e para vestir uma camisa em condições, é preciso (re)passa-la de manhã, à pressa, enquanto se rogam não sei quantas pragas, ao tamanho dos roupeiros, bem como à quantidade de roupa, que é tanta e parece sempre tão pouca.
Então olham-se para o dezassete metros quadrados de arrecadação, e rapidamente se traça um plano. Chama-se o carpinteiro, e depressa se monta um roupeiro que se destina à roupa da estação não vigente. Mandam-se fazer umas prateleiras até ao tecto para maximizar a arrumação, compra-se um escadote gigante (que o pé direito é bastante alto), e agora sim, temos sítio para arrumar tudo. A organização no seu pleno.
Mentira. Pura mentira. Em três tempos as prateleiras estão cheias. Cheias de tralhas que não se usam há uma mão cheia de anos, mas que não se deitam fora, porque ainda podem ser necessárias (mentira. pura mentira). E depois com os anos, às tralhas existentes acumulam-se novas tralhas, que não cabendo em casa, se levam para a arrecadação. E uma pessoa chega lá, abre a porta, e pensa onde vai encaixar mais esta prancha de bodyboard, e mais os fatos de bodyboard, e mais o calçado de verão, e mais os patins em linha. E encosta ali, no chão, nos poucos metros quadrados disponíveis. E uma pessoa pensa, tenho de vir dar um jeito nisto.
E quando se volta a precisar de lá entrar, para abrir o roupeiro e fazer a troca de roupa de verão para a de inverno (o drama a cada mudança de estação), uma pessoa descobre que as prateleiras do roupeiro que se destinavam a livros que não cabiam em casa, cederam com o peso, e os livros estão todos caídos no chão. E o acesso ao restante roupeiro está vedado pelas tralhas já colocadas ao calhas, e a cadeirinha de bebé  que estava arrumadinha no topo do roupeiro também caiu com todo aquele aparato (e uma pessoa pensa, que já não tem bebés, nem planeia mais nenhum, mas há o sobrinho, e os outros que hão-de vir,  e vá, ainda vai dar jeito).
E uma pessoa tenta empoleirar-se em cima do escadote gigante (que espaço não tem para abrir por completo por todas as tralhas espalhadas), e pensa, se me baldo daqui abaixo parto-me toda, fico aqui a ganir o resto do dia, e só me encontram já morta passados três dias. E uma pessoa desiste, vira costas, tenta esquecer o caos e pensa, tenho de vir dar um jeito nisto.
É hoje.
Caso a minha ausência seja prolongada, algures numa arrecadação, sem acesso a rede móvel, incontactável portanto, poderei estar eu, caída e submersa em tralhas que eu acho que ainda me fazem falta (mentira. pura mentira).

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Um problema tão meu

Uma grande amiga minha, acabou de me mandar a seguinte mensagem (privada) via facebook : "vi esta imagem, e lembrei-me logo de ti"


Querida amiga, obrigada por não o teres partilhado publicamente. Só os meus amigos mais íntimos sabem desta minha questão fisiológica/psicológica.
Mil e uma razões para jamais participar num reality show. Mas caso o fizesse, faria com certeza capa de revistas com uma hipotética gravidez, que não mais seria que uma barriga cheia de merda. 

sábado, 25 de outubro de 2014

Um quadradão do pior #2

Ainda a propósito do meu filho ser um quadradão do pior,
ontem de manhã, enquanto descíamos de elevador para a garagem, para mais um dia de escola/trabalho

Filha, dirigindo-se à minha pessoa: " essa camisa é mesmo gira, e fica-te mesmo bem. estás bonita hoje"

Filho: "isso é porque não estás a olhar para a camisa do mesmo ângulo que eu. porque se estivesses a ver por este ângulo, percebias que se vê que a mãe tem um soutien de lingerie branco"

Eu: "isso é porque não estás a olhar para o ângulo das minhas costas. se não, percebias que a nesga do soutien DE LINGERIE (?) que tu vês, é causado pelo peso que carrego às costas, que é nada mais nada menos, que a tua mochila de dez quilos. e tenho pena, mesmo muita pena da namorada que um dia te vai calhar na rifa"




quinta-feira, 23 de outubro de 2014

"bem-quereres de saudade"

"- Como se mede a saudade?" perguntou-lhe.
"- Mede-se em bem-quereres!" respondeu.
"- Tenho milhares de milhões de bem-quereres de saudade!" disse, então.

(roubado descaradamente daqui - onde vale a pena "passar" diariamente)

Saudades, tantas, dos locais onde outrora fui feliz.
Saudades, tantas, milhões (de bem quereres) sempre (de ti, avó).





quarta-feira, 22 de outubro de 2014

O peso do nome

Ainda a propósito do futebol em nossa casa.
O miúdo vai poder colocar pela primeira vez o seu nome nas costas da camisola (sim, que aquilo é um clube pobrezinho e não fosse o patrocínio de um pai, não havia cá destas mariquices).
Espantou-me o facto de se ter decidido por colocar o apelido. Sem pedir opinião, sem dar cavaco a ninguém.

- É para perpetuar o nome ? - Perguntei-lhe. O pai, o tio, o primo, foram todos jogadores profissionais a usar o apelido com orgulho nas costas.

- Não é bem por isso. É porque achas que eu tenho nome de jogador? Por acaso achas? Tu puseste-me um nome de miúdo. Conheces algum adulto com o meu nome? Achas que alguém me vai levar a sério em campo, com este nome nas costas?

(estou a refletir sobre o tema. ainda.)

A singularidade do isento

Cada vez acho mais que os meus filhos deviam substituir o tempo que passam agarrados ao telemóvel, por um bom livro. Não é tarefa fácil, mas juro que vou tentar.
Assim, a miúda, que está no 10º, e fez o seu primeiro teste esta semana, confessou-me que não sabia o significado de "singularidade". Assim como não compreendeu bem o texto, acerca do qual tinha várias perguntas de interpretação (estou a tremer com a nota que aí vem).

O miúdo, pediu-me para imprimir do site da Associação de Futebol de Lisboa, os dois  calendários de jogos, dos dois escalões onde está inserido. Não foi tarefa fácil, e constatei que há um sem número de clubes por este distrito fora, assim com uma fornada imensa de miúdos com pretensão  a jogadores da bola. Depois de impresso, verifiquei com agrado, que num dos escalões em que ele joga, há pelo menos quatro jornadas em que não vão jogar. O que me induziu a esperança de quatro sábados a poder dormir até mais tarde. Um bónus, portanto (pelo menos, para os pais).

-Então filho, vocês este campeonato vão parar uma serie de vezes...
-Não, não vamos.
-Vão, vão. Não viste o calendário?
-Vi, mas não vamos parar.
-Vão. Na segunda jornada param já.
- Não, não paramos. Vamos jogar com o ISENTO.
- Filho, o isento, não é um clube.
- Claro que é um clube. O isento é um clube.
-Não filho, não é. E tu nem digas uma coisa dessas no balneário, que isso é uma vergonha. O isento quer dizer que vocês estão livres, dispensados de jogar.

Olha para mim, meio corado, meio envergonhado, meio em pânico.

- Fogo, não acredito nisso! Então nós íamos jogar quatro vezes contra esses gajos!!!


(eu disse, um bónus para os pais. 
eu digo, gajos, o meu filho diz gajos?
eu disse, mais leitura. obrigatoriamente.)

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Precoce

Andava eu a cantar de galo, que a adolescência por estas bandas, até estava a ser de certa forma soft. Bem sei que às vezes me queixava, de uma ou outra coisinha na miúda, mas depois batia logo na boca. Que ainda a procissão vai no adro, e eu não me podia queixar. Uma santa a minha filha, uma santa nestas andanças conturbadas da adolescência. Por hora.
Bem sabia, que o miúdo estava prestes a pisar estes terrenos, tortuosos e possivelmente difíceis. Bem sabia, mas também sabia que isto nos rapazes dá-lhes um bocado mais tarde, o que me daria tempo de me ambientar à questão, e de alguma forma me preparar (alguém se prepara para isto?).
Cantei de galo, cedo de mais. O miúdo ou é precoce, ou está parvo de todo. Feitiozinho de merda, resmungão, a levantar garimpa, armado em engraçadinho, a reclamar das calças, da camisola, e do raio que o parta, agarrado ao telemóvel artilhado com códigos para que nunca alguém se atreva a espreitar quem envia tanta mensagem em tão curto espaço de tempo, a pentear minuciosamente a franja com gel, secador, mais para esquerda, um ligeiro toque para trás "tenho de ir cortar o cabelo", irritado com aquela penugem no lugar do bigode "mãe, arranca-me lá isto com cera", e a fazer um esforço desmedido para tomar as vitaminas que "têm um sabor nojento" mas lhe dão a esperança que o façam dar o tão esperado pulo, e o ponha ao nível dos outros miúdos da sua idade, que está farto de ser o mais baixo da equipa, o mais da turma, e o mais baixo da maioria dos miúdos mais novos que ele uns dois anos.
Por isso, olho para ele, rapazinho pequenino, no cimo dos seus doze anos empertigados e pergunto-me , isto é uma adolescência precoce, só pode ser, não é? 
(espero que sim, porque se for feitio, estou/estamos tramados) 

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Futebólódependentes Anónimos

Já tinha percebido que esta coisa do futebol no meu miúdo, é mesmo uma coisa intrínseca, que lhe sai por todos os poros da pele, que o faz feliz, que o anima.  Mas temo que se torne doentio, que se transforme numa obsessão, num vício, e quiçá tenha de ser eu a fundadora dos Futebólódependentes Anónimos. 
Joga em dois escalões, logo, treina em dois escalões. Horas, muitas horas. 
Sábado no escalão infantil, às 8:30 da manhã (repito, sábado: oito e meia da manhã) era suposto ter jogo treino. A equipa adversária não compareceu.
Quando desabafou comigo a injustiça do momento, fez um esforço para que ninguém visse aquelas duas lágrimas  traidoras, fugitivas, a quererem anunciar uma fraqueza/tristeza que a mais ninguém dizia respeito.
Domingo no escalão iniciados, às 9:30 da manhã (repito: domingo: nove e meia da manhã), era suposto ter o seu primeiro jogo para o campeonato. Mas tinha chovido a noite toda, o campo parecia uma plantação de arroz, e para tristeza dele, o arbitro mais não fez que o óbvio e razoável. Cancelou o jogo, adiado para outra núpcias. 
"eu ando a semana toda a acordar e a pensar quantos dias faltam para o fim de semana, para poder jogar, e depois é isto? nem um joguinho? nem um?"
Vais estudar para o teste de Português, disse-lhe, e assim ainda estás mais fresquinho.
Pedi-lhe que fizesse uma composição, "dá-me um tema" diz-me ele. De repente não me ocorre nada, e atiro "uma aventura no bosque encantado", coisa que dá pano para mangas, que é como quem diz, milhões de maneiras de dar asas à imaginação, que é como quem diz, não há desculpas "não me ocorrem ideias", o pão nosso de cada dia.
Aparece-me com uma página e meia escrita, eu penso que o tema foi de facto sugestivo, e leio. O primeiro parágrafo descrevia a sua incursão bosque dentro, e o aparecimento de um esquilo com uma pedra oca na mão. Devia tocar-se seis vezes na dita pedra, para entrar num outro espaço da floresta. Comecei a ficar entusiasmada, um esquilo com uma pedra (oca?), o pormenor dos seis toques, o suspense e a adrenalina perante um novo espaço encantado, já denotava alguma criatividade e imaginação. A coisa ia bem encaminhada.
Ultrapassado o primeiro obstáculo (que é como quem diz, seis ligeiras batidas numa pedra oca), eis que entramos num novo espaço geográfico. Um novo recanto da floresta, onde se avistava um belo campo de futebol. Novo obstáculo (embora não saibamos o objectivo do mesmo), uma partida de futebol entre a equipa dos batoteiros e ele (que depressa arranja uns comparsas para formar uma equipa, embora não saibamos se são outros humanos transeuntes como ele, ou um grupo de animais encantados - e não sabemos, porque esta descrição se faz em apenas uma linha). Todos os outros parágrafos são a descrição pormenorizada de um emocionante jogo de futebol. Com direito a minutos de jogo e tudo. A história termina da forma mais emocionante e heróica possível, quando ao minuto noventa mais três (atente-se ao pormenor 90+3 - significando que estávamos já em fase de descontos) com o jogo empatado, ele, ele mesmo, marca um belíssimo golo (com a descrição exacta de como o fez, incluso efeito da bola), terminando o jogo com uma vitória e um espectáculo nunca antes visto na floresta.
Corrijo os erros ortográficos (bolas, que este miúdo tem de ler mais), e peço-lhe que faça um convite, coisa que andam a treinar em aula. Pergunta-me o tema, atiro "convida alguém para o teu casamento". Torce-me o nariz, três minutos depois apresenta-me o resultado. "Exmo. Sr. Jorge Jesus, gostaria de o convidar para uma partida de futebol ..."
Penso pedir-lhe uma crónica. Desisto. Não me apetece ler a crónica daquele jogo, entre a equipa do Jorge Jesus e a dele. Digo-lhe, podes fazer uma pausa. Boa, diz ele, agarra numa bola e corre com ela nos pés.