quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Futebólódependentes Anónimos

Já tinha percebido que esta coisa do futebol no meu miúdo, é mesmo uma coisa intrínseca, que lhe sai por todos os poros da pele, que o faz feliz, que o anima.  Mas temo que se torne doentio, que se transforme numa obsessão, num vício, e quiçá tenha de ser eu a fundadora dos Futebólódependentes Anónimos. 
Joga em dois escalões, logo, treina em dois escalões. Horas, muitas horas. 
Sábado no escalão infantil, às 8:30 da manhã (repito, sábado: oito e meia da manhã) era suposto ter jogo treino. A equipa adversária não compareceu.
Quando desabafou comigo a injustiça do momento, fez um esforço para que ninguém visse aquelas duas lágrimas  traidoras, fugitivas, a quererem anunciar uma fraqueza/tristeza que a mais ninguém dizia respeito.
Domingo no escalão iniciados, às 9:30 da manhã (repito: domingo: nove e meia da manhã), era suposto ter o seu primeiro jogo para o campeonato. Mas tinha chovido a noite toda, o campo parecia uma plantação de arroz, e para tristeza dele, o arbitro mais não fez que o óbvio e razoável. Cancelou o jogo, adiado para outra núpcias. 
"eu ando a semana toda a acordar e a pensar quantos dias faltam para o fim de semana, para poder jogar, e depois é isto? nem um joguinho? nem um?"
Vais estudar para o teste de Português, disse-lhe, e assim ainda estás mais fresquinho.
Pedi-lhe que fizesse uma composição, "dá-me um tema" diz-me ele. De repente não me ocorre nada, e atiro "uma aventura no bosque encantado", coisa que dá pano para mangas, que é como quem diz, milhões de maneiras de dar asas à imaginação, que é como quem diz, não há desculpas "não me ocorrem ideias", o pão nosso de cada dia.
Aparece-me com uma página e meia escrita, eu penso que o tema foi de facto sugestivo, e leio. O primeiro parágrafo descrevia a sua incursão bosque dentro, e o aparecimento de um esquilo com uma pedra oca na mão. Devia tocar-se seis vezes na dita pedra, para entrar num outro espaço da floresta. Comecei a ficar entusiasmada, um esquilo com uma pedra (oca?), o pormenor dos seis toques, o suspense e a adrenalina perante um novo espaço encantado, já denotava alguma criatividade e imaginação. A coisa ia bem encaminhada.
Ultrapassado o primeiro obstáculo (que é como quem diz, seis ligeiras batidas numa pedra oca), eis que entramos num novo espaço geográfico. Um novo recanto da floresta, onde se avistava um belo campo de futebol. Novo obstáculo (embora não saibamos o objectivo do mesmo), uma partida de futebol entre a equipa dos batoteiros e ele (que depressa arranja uns comparsas para formar uma equipa, embora não saibamos se são outros humanos transeuntes como ele, ou um grupo de animais encantados - e não sabemos, porque esta descrição se faz em apenas uma linha). Todos os outros parágrafos são a descrição pormenorizada de um emocionante jogo de futebol. Com direito a minutos de jogo e tudo. A história termina da forma mais emocionante e heróica possível, quando ao minuto noventa mais três (atente-se ao pormenor 90+3 - significando que estávamos já em fase de descontos) com o jogo empatado, ele, ele mesmo, marca um belíssimo golo (com a descrição exacta de como o fez, incluso efeito da bola), terminando o jogo com uma vitória e um espectáculo nunca antes visto na floresta.
Corrijo os erros ortográficos (bolas, que este miúdo tem de ler mais), e peço-lhe que faça um convite, coisa que andam a treinar em aula. Pergunta-me o tema, atiro "convida alguém para o teu casamento". Torce-me o nariz, três minutos depois apresenta-me o resultado. "Exmo. Sr. Jorge Jesus, gostaria de o convidar para uma partida de futebol ..."
Penso pedir-lhe uma crónica. Desisto. Não me apetece ler a crónica daquele jogo, entre a equipa do Jorge Jesus e a dele. Digo-lhe, podes fazer uma pausa. Boa, diz ele, agarra numa bola e corre com ela nos pés.  

1 comentário:

  1. Estou alegre por encontrar blogs como o seu, ao ler algumas coisas,
    reparei que tem aqui um bom blog, feito com carinho,
    Posso dizer que gostei do que li e desde já quero dar-lhe os parabéns,
    decerto que virei aqui mais vezes.
    Sou António Batalha.
    Que lhe deseja muitas felicidade e saúde em toda a sua casa.
    PS.Se desejar visite O Peregrino E Servo, e se o desejar
    siga, mas só se gostar, eu vou retribuir seguindo também o seu.

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