sábado, 30 de abril de 2016

Porque eu mereço

Presente (adiantado) do dia da mãe.
Constato que o miúdo pode ter futuro como carpinteiro ou pintor. Já eletricista será melhor não arriscar (o quadro da luz sucumbiu ao primeiro impacto - quiçá com tamanha magnificente obra de arte). Surge agora a dúvida  (até pouco pertinente, entenda-se): sabendo à priori que se encaixa em qualquer  projecto decorativo, ainda não decidi onde colocar...
Ainda assim, e sabendo que o candeeiro é meu, o quarto do projectista parece-me o local mais indicado...

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Desenrascado #1

Estávamos em pleno agosto. Um calor do caraças.
Ele aninhou-se comigo no sofá, "bora ver um filme".
Não sei quem adormeceu primeiro, nunca sei. Acordei, puxei-o por um braço, e encaminhei-o para a cama. Mãos nos ombros, e vou-lhe guiando o caminho, enquanto ele murmura umas quantas frases sem sentido. Apesar de ser pequeno para a idade, longe vão os tempos em que o carregava ao colo, aninhado nos meus braços. Ainda que também, desnorteada pelo sono, consegui ver-lhe as calças de pijama, de flanela, aquilo que me pareceu, arregaçadas até ao joelho. Ainda que tonta de sono, pensei "que parvoíce a deste miúdo, umas calças de flanela, em pleno verão...".

No dia seguinte de manhã, quando me apareceu, despenteado e a bocejar, já eu, bem acordada, vi a imagem do Tom Sawyer à minha frente. Antes que eu pudesse articular uma palavra, e perante o meu olhar incrédulo, ele justificou de imediato:

"Oh mãe, não tenho culpa! Não tinha nenhuns calções de pijama na gaveta, e estava muito calor para vestir calças!"



( ninguém o pode acusar de não ser desenrascado...)

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Sigo. caminhando.

A um trabalho, acumulei outro. Subtraí o tempo e a constatação de que nada sobra. Mas sigo, caminhando, com a mesma força (ou gosto de pensar que sim) e mais algum entusiasmo (quase sempre, assim). 
Consegui arranjar meia hora para dar cabo de metade do meu cabelo. Não lamentei as décadas de cabelo comprido, e estou mais leve. 
Os miúdos vão gerindo a vida académica um pouco à sua maneira, sem que eu pressione (tanto) ou saiba com precisão as datas dos testes  (vou sabendo, assim de uma forma mais geral), e a coisa não tem corrido mal (à parte aquela negativa a matemática do miúdo). 
O diretor de turma dele, diz que ele se queixou de que dou mais atenção à irmã. A irmã queixa-se (cheia de razão), de que perco demasiado tempo fora de casa, só para o levar/buscar ao futebol. 
O carro pede pastilhas e revisão (entupido de razão). São cerca de cem, os quilómetros diários.
Eu não peço nada (quase). Não me queixo de nada (quase). 
Só à noite, quando me deito, e converso com Ele. 

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Foi hoje

Voltámos à rotina. 
Com ela, a constatação de vários dramas, que se abateram sob as cabeças adolescentes desta casa. 
Ela, que se apercebeu hoje, logo hoje, primeiro dia de aulas, que não tem nada para vestir. O horror, o descalabro. Disse-lhe que sim, que tinha razão, evitando parecer mais irónica do que o que estava a ser na realidade, porque no fundo, é um drama que reconheço ser comum a ambas. 
Ele acordou, olhou-me ensonado e disse "estou muito preocupado". Perguntei porquê, embora sem grande entusiasmo, a primeira meia hora da manhã, todos sabem, não sou dada a grandes diálogos. Afinal, está só preocupado com o oitavo ano. Menos mal. 
Enquanto partilhávamos todos a minha casa de banho (rotina a que já não estava habituada, vá-se lá perceber porque é que não se distribuem pelas outras duas, e andamos ali os três a discutir dois lavatórios), e ele transformava a franja numa ostensiva pôpa, rematou:
"parece-me que vou entrar em depressão. esta vida não foi feita para mim". 

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

De rotinas. Precisa-se.

De escola. Precisa-se.
Está a fazer-lhes uma falta danada. Eles não sabem. Mas eu sei. Eles acham que não . Eu tenho a certeza que sim . 
Não há razões de queixa das férias. Ninguém se queixa. Nem eu, muito menos eles. Algarve e Sesimbra comigo. Porto com o pai. Ele novamente Algarve com amigos. Ela com as amigas ainda foi à comporta, a Alenquer e a Londres. Mas agora estão em casa. E não há quem os ature. Ele tem desafiado a construção da nossa casa. É das boas. Um bom investimento, tenho atestado. Os constantes remates às paredes, e nem uma lasca na tinta, ou um bocado de estuque ao chão. Tem sido um desafio também à paciência da vizinhança que ainda não se queixou.
Ela esgotou todas as temporadas da anatomia de grey, que resolveu ver desde os tempos primórdios, num daqueles sites manhosos ( ilegais) com legendas em português brasileiro, do pior que pode haver. Tem sido um teste ao pobre computador, que ao fim de umas horas bufa por todos os orifícios, a anunciar o cansaço através de uma barulhenta ventoinha. 
E depois há o teste à minha paciência , com as constantes guerrilhas entre eles, quem acabou com a nutella,  "que ainda ontem havia um frasco quase cheio", de quem é a vez de ir com o cão à rua, "que não posso ser eu, que já fui mais vezes e isto assim é uma injustiça", quem é que deixou aquele copo na sala "não fui eu" " nem eu" e não foi ninguém, de quem é a vez de pôr a mesa "ontem fui eu!" " tás-te a passar? Fui eu !", e que ela está farta do mau feitio dele, e que ele está farto  daquele feitiozinho dela, e se as férias não acabam, ainda vislumbro pancadaria  na certa. 
E eles estão fartos de mim, e da minha mania das arrumações e limpezas ( não é uma mania, já disse), e do meu feitio autoritário ( de mãe ), e das minhas queixas com os horários desconcertados deles ( e é a razão pela qual sou a única a não conseguir ver o filme da noite até ao fim, outra queixa deles ), e do cão não ser minha responsabilidade ( apesar de o passeio nocturno ser maioritariamente meu, porque eu ladro, mas não mordo). 
Na verdade, estamos mesmo a precisar das rotinas. De escola, de dança, futebol e natação, de energias gastas, para daqui a dois meses nos estarmos a queixar delas, e a ansiar por novas férias.

Estou cá.

Provavelmente nem vale a pena explicar a ausência.
Até porque na verdade, nem há razão plausível a explicar.

Entro assim de fininho, como se nada fosse, como se quase dois meses não tivessem passado, e retomo o fio à meada.
Estou cá. Não sei se para ficar, mas estou.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Nesta, ou noutra vida


-Um dia vamos ?
-Sim. Um dia.
-Juntos?
-Sim. Juntos.
-Um dia, quando?
-Não sei. Um dia.
-Nesta, ou noutra vida?
-Talvez nesta. Talvez noutra.
-Sim... Noutra, talvez.