sexta-feira, 4 de abril de 2014

Inspira. Expira. Ventila.

Uma pessoa tem um dia de cão, porque sai de casa com chuva e com frio (e onde é que anda a porra da primavera no meio disto tudo? emigrou, foi?), leva os miúdos à escola, os seus e os da amiga (quatro no total, comigo cinco, e o carro só dá para quatro), pede-lhes que ponham os cintos ("um para dois, esforcem-se que conseguem, que isto sem cinto é que ninguém vai")  e reza para que as autoridades não se lembrem de fazer uma operação stop nestes poucos km que distanciam a nossa casa do colégio (está a chover, é pouco provável). Chega à escola, e o trânsito para entrar está entupido. Chove a potes e digo aos miúdos para saírem mesmo ali, que a fila está parada, não faz diferença. Para o senhor (anormal) do carro atrás fazia muita diferença, porque buzinou desenfreadamente perante o (quase) pânico dos miúdos a tirar as mochilas e a tentarem sair dali o mais rapidamente possível (para ficarmos parados mais dez minutos, um metro e meio à frente, o que me leva a ter a certeza que que isto anda mesmo tudo avariado do sistema - da tola). Uma pessoa chega ao escritório, atura o que tem de aturar, faz o que tem a fazer, e quando olha para o relógio, sai a correr porque tem de ir buscar o avô a casa da mãe, para o acompanhar a uma consulta de cardiologia. Olha para o avô, enquanto espera a consulta, e percebe que a velhice é mesmo uma coisa tramada, e que o avô está mesmo a ficar cada vez mais velhinho. Entra na consulta, sai da consulta, fazer analises, entra novamente na consulta, olha para o relógio e percebe que talvez não dê tempo de chegar à sua própria consulta , dali a quarenta minutos. Ainda dentro da consulta, ouve todas as diretrizes do médico, enquanto rabisca disfarçadamente uma mensagem a pedir auxilio no regresso do avô a casa. O cunhado aparece neste auxilio, uma pessoa arranca desenfreadamente para a outra ponta da cidade, liga para o consultório  a avisar que vai chegar atrasada, e a rececionista informa que a consulta estava marcada para duas horas antes. Uma pessoa enerva-se, porque apesar de saber que é um bocado (muito) distraída tinha escrito na agenda, e confirmado tudo direitinho, e não se inibe de quase chamar incompetente à senhora rececionista que ainda no dia anterior tinha ligado a confirmar a dita consulta, e uma pessoa até pode ter um ouvido afanado (razão que a leva a este raio desta consulta), mas garante que ainda ouve e percebe bem o que lhe dizem, daí estar a caminho da mesma, na hora combinada. A senhora rececionista não desiste de informar que tem a certeza que a colega que ligou ontem disse as horas certas, uma pessoa deste lado garante que também tem  a certeza do que ouviu e escreveu por duas vezes, e vai a caminho. Depois de ventilar umas quantas vezes até chegar ao destino, uma pessoa entra, simpaticamente sem desancar as senhoras duas rececionistas, que informam simpaticamente também que a senhora professora vai atender já de seguida. Senhora professora doutora simpaticamente atende-me fora de horas, olha para as magnificas fotografias que trago debaixo do braço, resultado da tac que me havia pedido, explica-me que estou novamente toda entupida de nhanha, mostra-me a nhanha na foto, aquela massa intrusa que ali se alojou, usa o termo tumor benigno, assim como quem não quer a coisa, oiço tudo como quem não quer a coisa também, passa-me a catrefada de exames que tenho para fazer, antes de ir à faca. Digo que sim senhor, irei fazer tudo, e informarei de quando me dá jeito levar a facada. Uma pessoa sai dali, a pensar no fato reciclável que ainda tem para fazer com o miúdo, para levar amanhã para a escola para o desfile da primavera (mas qual primavera?), pensa no materiais que vai precisar, liga ao ex-rei a pedir para comprar os materiais antes de trazer o miúdo do futebol para casa. Uma pessoa chega a casa, informa como quem não quer a coisa que vai ser operada dentro em breve, nada de especial, a filha reage da mesma maneira com um "oh...", ok, nada de especial, uma pessoa decide não contar já ao filho porque não sendo nada de especial, o filho não vai reagir da mesma forma (no mínimo o "oh" da filha, é precedido de um "não vais morrer, pois não?"), e uma pessoa precisa que o filho colabore na elaboração de um fato de espantalho, que uma mãe idealizou porque o filho não colaborou em fazê-lo na sala de aula, e embora o raspanete, uma mãe não quer que o filho seja o único que não tenha fato. Uma pessoa faz um fato com materiais recicláveis enquanto o diabo esfrega um olho, olha para o resultado final e pensa com orgulho que para vinte minutos não ficou nada mal, uma pessoa ainda ouve o filho reclamar que não leva a imitação de chapéu de palha, engendrada com cartolina porque vai fazer figura de estupido, uma pessoa dá dois berros e controla-se para não dar duas palmadas (merecidas), uma pessoa deita-se e pensa na data que vai escolher para tirar a nhanha.
 
 

4 comentários:

  1. A minha avó dizia assim: quem tem filhos tem cadilhos.
    Agora atenta-te mas é nesse dia da operação.

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    1. A minha dizia o mesmo. Achei sempre um exagero, até ter os meus...
      Vou tentar atentar-me a esse dia. Não arranjo agenda para tal. Ainda. Não se avizinha nenhum mês que me dê jeito. Mas algum buraco se ha de arranjar!

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  2. E já viste quem passou para a minha lateral????????????? Pois...

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    1. Tu és uma kiduxa, uma fofinha, e não arranjo mais nada acabado em uxa, ou em inha. Mas és isso tudo que agora não me ocorre (e eu que uso estas expressões a dar c'um pau, agora não me lembro de + nenhuma...). Qdo eu fizer uma lateral assim, vais ver a uxa e a inha que eu tb sou!

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